Tentação do dízimo (CC)
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nas referências sublinhadas para ter acesso aos textos)
1 – Introdução
No
número 932 da revista “Portugal Evangélico” das Igrejas Metodista e Presbiteriana
de Portugal, foram publicados vários artigos sobre a contribuição cristã,
apresentando várias opiniões sobre o assunto que começamos por divulgar:
1.1 - O dízimo - De autoria do Pastor Brissos
Lino, da Igreja do Jubileu de Setúbal
“A última parte da pessoa que se
converte a Deus é a carteira”. Esta conhecida expressão simboliza a dificuldade
que alguns cristãos têm em lidar com as suas finanças no reino de Deus.
O dízimo é prática corrente na
generalidade das igrejas evangélicas, e fundamenta-se em razões bíblicas,
teológicas e de carácter prático.
Bases bíblicas
O dízimo era observado entre os povos
antigos, existiu antes da lei de Moisés (Abraão e Jacob), foi estabelecido e
confirmado na Lei, mas também ao longo de todo o Antigo Testamento foi
praticado, como no tempo de Amós 4:4, no reinado
de Ezequias 2º
Crónicas 31:2/5, nos dias de Neemias. Neemias 10:37/38;
Neemias 12:44; Neemias 13:5/12,
e com Malaquias
3:8/10.
No Novo Testamento, Jesus aprovou a
prática do Dízimo, tanto na forma expressa Mateus 23:23, como tácita
Lucas 11:42; Lucas 18:12. O
dízimo é também legitimado pelo autor da Carta aos Hebreus, que apresenta duas
ordens de sacerdócio, a de Levi e a de Melquisedeque, Levi recebeu dízimos do
povo, de acordo com a lei de Moisés, e Melquisedeque recebeu-os de Abraão, em
tempos anteriores à Lei. Se o dízimo como instituição não se inicia com a lei,
mas lhe é anterior, também não termina com a vigência dela. Sendo Melquisedeque
o símbolo do sacerdócio eterno de Cristo, e tendo recebido dízimos, faz sentido
que a igreja os receba.
O apóstolo Paulo também faz referência
implícita em 1ª
Coríntios 9:13/14
Princípios do reino
Muitos dos princípios do reino de Deus
são opostos aos princípios e valores do mundo. Se tenho dez e dou cinco,
restam-me cinco. Mas a matemática do reino é diferente. Quando se dá a Deus Ele
age sobrenaturalmente de modo a que nunca nada nos falte, Com Deus o menos
torna-se mais, e sem Deus acontece o contrário.
O cristão sabe que nada é dele, tudo
pertence a Deus. Sendo assim, o dízimo funciona como prova de fé. Quando
devolvemos a Deus dez por cento do que dele recebemos estamos a colocá-lo à
prova. Foi Ele que disse: “Fazei prova de mim”. Este é o único momento em que
temos o direito de colocar Deus à prova.
Responsabilidade dos membros
A igreja é o conjunto dos fiéis, não o
edifício. A responsabilidade pelo sustento da obra do Senhor pertence aos
membros de cada igreja local. A prática do dízimo, além das ofertas alçadas,
está relacionada com a necessidade de suprir as necessidades financeiras da
casa de Deus. Contribuir para o sustento do centro de adoração é mais do que um
dever do cristão, é um verdadeiro privilégio, pois torna os fiéis participantes
da Obra, verdadeiros cooperadores de Deus.
A
lei da sementeira e da colheita
Se
alguém quer ser abençoado na sua vida financeira tem que semear no reino. Se
semear amor colhe amor, se semear perdão, colhe perdão, se semear finanças
colhe finanças. Ninguém colhe batatas se semear cebolas. Colhemos da mesma
espécie que semeamos. Mas este princípio não funciona apenas no tocante à
qualidade da semente, mas também à quantidade. Quem semeia muito colherá muito,
quem semeia pouco, pouco há de colher.
Por
muitas dificuldades que o agricultor passe não cairá no erro grosseiro de comer
as sementes. Ele sabe que precisa delas para as lançar à terra, pois são a
garantia de que virá a colher, no seu tempo, o que semear.
Mas
é exactamente isto que acontece a muitos cristãos. Em vez de semear a semente
que Deus lhes coloca na mão, comem-na… Quando chega a hora da sementeira não há
semente para lançar à terra. E não havendo semente não haverá colheita. Pense
nisso.
1.2 – Dízimo, preceito cristão? De autoria do Pastor Alderi
Souza de Matos, Doutor em história da igreja pela Universidade de Boston.
A
prática do dízimo é um tema controverso nas igrejas evangélicas, tendo, de um
lado, defensores apaixonados e, do outro, críticos ardorosos. Para alguns, é
uma espécie de legalismo judaico preservado na igreja cristã. Para outros,
trata-se de uma norma divina que tem valor permanente para o povo de Deus, na
antiga e na nova dispensação. Os críticos do dízimo afirmam que a sua
obrigatoriedade é contrária ao espírito do evangelho, pois Cristo liberta as
pessoas das imposições da lei. Os defensores alegam que essa posição é
interesseira, porque permite às pessoas eximirem-se da responsabilidade de
sustentar generosamente a igreja e as suas actividades. O grande desafio nesta
área é encontrar o equilíbrio entre estas posições divergentes. O que está em
jogo é uma questão mais ampla - o conceito da mordomia cristã, do uso que os
cristãos fazem dos seus recursos e bens.
Os
dados bíblicos
O
dízimo (do latim decimu) pode ser definido como a prática de dar a décima parte
de todos os frutos e rendimentos para o sustento das instituições religiosas e
dos seus ministros. Trata-se de um costume antigo e generalizado, sendo
encontrado tanto no judaísmo como nas culturas vizinhas do Oriente Médio. Esta
prática é claramente estabelecida no Antigo Testamento, sendo até mesmo
anterior à lei de Moisés Génesis 14:20; Génesis 28:22. O
dízimo era devido primariamente a Deus, como expressão de gratidão pelas suas bênçãos
e como sinal de consagração. Mais tarde, tornou-se um preceito formal na vida
religiosa dos hebreus Levítico 27:30/32,
sendo destinado especificamente para o sustento dos levitas Números 18:21/24.
No
Deuteronómio, está associado a uma refeição comunitária festiva e ao auxílio
aos necessitados Deuteronómio
12:17/19; Deuteronómio
14:22/29; Deuteronómio
26:12/14. Às vezes era dado liberalmente 2º Crónicas 31:5/6;
Neemias 10:37/39;
Neemias 12:44
noutras ocasiões retido, fraudulentamente Miqueias 3:8/10.
Nos
escritos do Novo Testamento, o dizimo é mencionado explicitamente apenas nos
Evangelhos e na epístola aos Hebreus, sempre em relação aos judeus. Jesus aprovou
a prática, mas censurou-a quando se tornava uma expressão de frio legalismo Mateus 23:23; Lucas 11:42; Lucas 18:12; ver Amós 4:4. Em
Hebreus, é mencionado em conexão com Melquisedeque, uma figura do sacerdócio de
Cristo Hebreus
7:1/10. As epístolas Paulinas falam muito sobre ofertas para a comunidade,
mas a sua ênfase maior é sobre as contribuições voluntárias 2ª Coríntios 9:6/7.
O Novo Testamento não fornece muitas informações sobre o sustento do trabalho
regular da igreja. Todavia, as informações disponíveis destacam atitudes como
gratidão, fé, amor e generosidade como motivações centrais da mordomia cristã.
O
dízimo na história
No
início da igreja, a informalidade e a simplicidade das estruturas não exigiam
muitos recursos para a sua manutenção. Não havia templos nem ministério a tempo
integral (muitos líderes eram “fazedores de tendas”, como Paulo). A maior carência
estava na área social ou beneficente. Daí a grande ênfase nas ofertas,
principalmente em situações de particular necessidade (ver 1ª Coríntios
16:1/4; 2ª
Coríntios 8 e 2ª Coríntios 9. No
entanto, o princípio de que a contribuição devia ser marcada pelo
desprendimento e liberalidade manteve-se, como se pode ver na Didaquê, um
manual eclesiástico do 2° século: “Tome uma parte do seu dinheiro, da sua roupa
e de todas as suas posses, segundo lhe parecer oportuno, e os dê conforme o
preceito” (13.7). No final do mesmo século, Ireneu de Lyon referiu-se aos cristãos
como aqueles que “separam todas as suas posses para os propósitos do Senhor,
entregando de modo alegre e espontâneo as porções não menos valiosas da sua
propriedade” (Contra as heresias IVI8).
Com o passar do tempo e a crescente institucionalização da igreja, houve a necessidade de uma forma padronizada de contribuição. Assim, recorreu-se ao precedente bíblico já conhecido e testado durante muito tempo – o dízimo. Ao longo dos séculos, ele tornou-se obrigatório – uma espécie de imposto eclesiástico – e na época de Carlos Magno passou a integrar a lei civil.
No
final da Idade Média surgiram abusos quando os dízimos, em certos casos, se
tornaram um instrumento para a compra de cargos eclesiásticos (simonia). Houve
controvérsias quando as pessoas procuravam fugir ao pagamento dos dízimos
enquanto outras tentavam apropriar-se desses rendimentos para si mesmas. Os
países que tinham igrejas estatais recolhiam os dízimos dos fiéis em troca do
sustento da igreja e do pagamento dos salários dos ministros (côngrua). No
Brasil colonial, em virtude do sistema conhecido como “padroado”, o dízimo
tornou-se o principal tributo arrecadado pelo estado português.
Validade
actual
A
questão que se coloca é a seguinte – o dízimo é valido hoje em dia para os cristãos?
É uma forma legítima de contribuição cristã? São muitos os factores a serem
considerados na procura de uma resposta. Em primeiro lugar, é preciso atentar
para o ensino bíblico global sobre o lugar que os bens devem ter na vida do
crente. Deus é o senhor e proprietário supremo de todas as coisas. Os seres
humanos são mordomos, ou seja, administradores dos recursos e dádivas de Deus.
Aqueles que realmente o amam, que são gratos pelas suas bênçãos e querem
servi-lo, sentir-se-ão movidos intimamente a contribuir para causas que
engrandecem o seu nome.
A
segunda consideração é pragmática. A igreja é uma associação voluntária. Ela
não tem outra fonte estável de sustento a não ser as contribuições dos seus
membros. As ofertas ocasionais são, comprovadamente, insuficientes para atender
a todas as necessidades financeiras da comunidade cristã. Torna-se necessário
um método de contribuição que seja regular, generoso e proporcional aos
recursos dos fiéis.
Outro
argumento baseia-se numa comparação entre Israel e a igreja. Os cristãos
entendem que têm recebido bênçãos muito maiores que a antiga nação judaica. O
que para esta estava na forma de promessas, para os cristãos são realidades
concretas, presentes.
A
vinda do Messias, a sua obra de redenção, os seus ensinos e dos seus apóstolos
(o Novo Testamento), a dádiva do Espírito Santo e a revelação mais plena da
vida futura são exemplos desses grandes benefícios usufruídos plenamente na
nova aliança. Daí, decorre o seguinte raciocínio: se Deus prescreveu o dízimo para
o antigo povo de Israel, seria de se esperar que ele requeresse menos dos
cristãos, detentores de maiores dádivas? Portanto, muitos estudiosos concluem
que o dízimo deve ser, não o teto da contribuição cristã, mas o piso, o mínimo,
o ponto de partida.
Conclusão
A
questão do dízimo é tão difícil para muitos cristãos porque toca numa parte
sensível da sua vida - o bolso. Parece excessivo entregar um décimo dos
rendimentos a Deus, para a causa de Cristo. Nem todos têm o desprendimento e a
generosidade da pobre viúva elogiada por Jesus Mateus 12:41/44
Todavia, o dízimo pode ser uma bênção na experiência do cristão em dois
sentidos. Primeiro, como um desafio para a sua vida espiritual. Dar o dízimo
pressupõe uma relação de amor, gratidão e compromisso com Deus e com as pessoas
que serão beneficiadas com essa contribuição. Em segundo lugar, é também um
desafio para a melhor administração da vida financeira. Muitas pessoas têm
dificuldade em contribuir para a igreja e suas causas porque são
financeiramente desorganizadas, gastam mais do que podem, não têm sentido de
prioridades. A prática do dízimo produz uma disciplina que beneficia outras
áreas da vida. Para aqueles que querem trilhar este caminho, a sugestão é que
comecem a aumentar gradativamente a sua contribuição, até atingir o padrão do
Antigo Testamento... e então ir além dele.
1.3 – Dar a Deus o que é de Deus… De autoria da
Pastora Eva Michel
Para
ser franca desde o início: eu não gosto de falar de dinheiro. Nem de lidar com
ele... Fazer compras num centro comercial não me traz prazer por aí fora, ir ao
banco ainda menos e preparar relatórios financeiros, nem falar. Claro,
reconheço a importância do dinheiro, tanto na vida de cada um como na vida da
igreja, mas, digamos, procuro não lhe dar mais atenção do que a absolutamente
indispensável e - modéstia completamente
à parte - julgo que Jesus não terá agido de maneira muito diferente, nesta
matéria. Ou estarei enganada?
Certo:
Jesus e os doze lidaram com dinheiro - caso contrário, nem os discípulos iam
sugerir comprar pão para a multidão Marcos 6:37, nem
seria preciso um administrador da caixa comum João 12:6. Caixa
esta que pressupõe ter havido quem para ela contribuía. Mais: parábolas como a
dos talentos, a do servo endividado, a dos trabalhadores na vinha Mateus 25:14 ss.; Mateus 18:23 ss.; Mateus 20:1 ss. mostram que a realidade económica não está ausente da
Bíblia e pode mesmo servir de imagem para o Reino de Deus.
Mas
depois, há o outro lado da história! Fico pasmada ao dar-me conta de como o
dinheiro (muito dinheiro!) entra para financiar uma campanha de “desinformação”
acerca da Páscoa: os guardas do túmulo de Jesus subornados para... divulgarem
que o corpo de Jesus terá sido roubado enquanto eles dormitavam! Dinheiro,
usado para deturpar, para eliminara mensagem da Vida, da Ressurreição! Assim,
no evangelho de Mateus
28:11 ss.
Será
uma passagem excepcional? De modo algum, como mostra até uma leitura
superficial deste mesmo evangelho: os discípulos não devem levar dinheiro para
o seu caminho, sublinha Mateus 10:9, o apego
aos bens impede o jovem rico de seguir Jesus Mateus 19:16 ss, Judas trai o Mestre por 30 moedas. Mateus 26:15. Quando
uma mulher unge Jesus com um óleo muito caro, este critica os que não conseguem
apreciar o profundo significado do gesto, lembrando-se apenas do dinheiro. Sem
dúvida: ao longo de todo o seu evangelho, Mateus alerta-nos para o risco que
correm os que não conseguem desprender-se do dinheiro - ou da sua preocupação
com o dinheiro. E resume: não se pode servir a Deus e a Mamon (termo aramaico
para designar a riqueza) Mateus 6:24 ao mesmo
tempo.
Costuma
citar-se, neste contexto, a orientação de Jesus: “Dai a César o que é de César
e a Deus o que é de Deus” Mateus 22:21,
avançando-se depois, quase irremediavelmente, ou para um apelo aos deveres
cívicos dos cristãos (pagar os impostos) ou para sugerir que aumentem as suas
contribuições para a igreja.
Suspeito,
porém, que as palavras de Jesus nos levem bem mais longe. Vivemos hoje numa
sociedade, num mundo em que, como nunca antes, tudo é transformado em
mercadoria, com consequências escandalosas: milhões sem água potável por não
poderem pagá-la; pessoas, inclusive entre os membros da nossa igreja, a terem
de escolher entre comer ou ir ao médico pois a reforma não chega para ambos;
dividendos chorudos para os accionistas de empresas que atingem lucros como
nunca antes visto, depois de terem mandando para o desemprego milhares dos seus
trabalhadores. Nunca antes a distribuição das riquezas neste mundo foi de tão
extrema desigualdade. Até a vida (animais, plantas e inclusive partes do corpo
humano) está a ser patenteada e, deste modo, sujeita à comercialização.
Confrontado
com esta realidade, como reagiria Jesus? Poderia ficar ele calado?
Dar
a Deus o que é de Deus: não significa isto empenharmo-nos com tudo o que somos
e tudo o que temos para que este escândalo acabe? Hoje a questão não se coloca
entre dar a César ou dar a Deus, parece-me, hoje o profundo, o imenso desafio é
darmos a Deus o que é dele, em vez de nos agarrarmos àquilo que consideramos
“nosso”.
Um
dia Jesus chama a atenção dos discípulos para uma viúva pobre que coloca os
seus tostões no ofertório Marcos 12:41/44
Que profundo carinho para esta mulher simples e sem nome, transparece das
palavras de Jesus! Muito do dinheiro que a nossa igreja recebe é oferecido por
pessoas como esta viúva e com a mesma dedicação. Sinto que esta realidade
coloca uma enorme responsabilidade sobre os ombros das mulheres e dos homens
que administram o dinheiro da igreja e o aplicam ao seu trabalho. Sempre que
gastarmos dinheiro da igreja, recordemo-nos, com o mesmo afecto com que Jesus
olhou a viúva, daqueles que o ofereceram.
Dito
tudo isto, reconheço que talvez deva corrigir a minha observação inicial:
afinal, o dinheiro não é de todo um tema neutro e irrelevante para Jesus e,
portanto, para a nossa fé e a nossa vida como igreja. Quando Jesus entra na
cidade e vê Zaqueu sentado na árvore, observando tudo à distância sem querer
envolver-se demasiado - numa atitude consumista, diríamos hoje! - Jesus vai ter
com ele. “Hoje preciso de comer em tua casa!”. Mais uma história sobre o
dinheiro. E sobre uma conversão que abre caminhos para a vida e para o futuro:
a Zaqueu, a nós, à igreja.
1.4 – A Igreja e o dinheiro: Fundamentos bíblicos – De autoria do
Pastor Manuel Pedro
Cardoso
Para
sabermos como deve situar-se a Igreja em relação ao dinheiro, sublinhemos desde
logo o ensino de que a Igreja é o Corpo de Cristo 1ª Coríntios 12:27
e o seu modo de pensar e agir têm de ser determinados
pelo modo de pensar e agir do Senhor, conforme nos é revelado nas Escrituras.
Falar da atitude que a Igreja ou os cristãos individualmente devem ter em relação
ao dinheiro é falar da atitude que Cristo tem nos Evangelhos em relação ao
mesmo assunto, porque ser Igreja de Cristo é ser o povo que segue a Cristo João 10:4 e João 10:27,
implicando o seguimento a ideia da imitação 1ª Coríntios 11:1;
Efésios 5:1; Filipenses 2:5.
Ora, as Escrituras falam-nos do Cristo que nasceu e viveu pobre, que anunciou o
Evangelho aos pobres Mateus
11:5, e proclamou a pobreza como bem-aventurança Mateus 5:3; Lucas 6:26. O leitor
da Bíblia não tem dificuldade em perceber que estava certa a Teologia da
Libertação quando falava da “opção de Cristo pelos pobres” e da consequente
necessidade de que a Igreja não seja apenas uma Igreja com os pobres ou para
os pobres, mas de ser a Igreja pobre e dos pobres.
O
dinheiro é necessário
O
dinheiro é uma invenção inteligente do homem para a organização das sociedades
e em princípio não há nenhum erro em utilizá-lo. O que é condenado é o “amor do
dinheiro”, a ganância, 1ª
Pedro 5:2; 1ª Timóteo 6:10,
não o dinheiro em si mesmo. Até no grupo inicial formado por Jesus e seus
apóstolos houve necessidade de usar dinheiro João 12:6,
certamente obtido através de ofertas. A Igreja primitiva de Jerusalém é
descrita como uma comunidade que conheceu a necessidade de fazer dinheiro com a
venda de “propriedades e fazendas” para socorrer os mais necessitados Actos 2:45; Actos 6:7. E quando
os problemas materiais da Igreja de Jerusalém aumentaram com a fome que
sobreveio, o apóstolo Paulo levantou entre os cristãos da Ásia Menor uma
colecta a favor dos santos de Jerusalém
1ª Coríntios 16:1
ss, usando-se aqui santos no sentido de “cristãos”,
“membros da comunidade”, mas obviamente era a “santos” pobres que o dinheiro se
destinava, e pobres eram nessa altura, muito provavelmente, a quase totalidade
dos cristãos, incluindo os apóstolos. Por esses dias Pedro disse a um coxo
mendigo: Não tenho prata nem ouro Actos 3:6. Uma
Igreja pobre diante do homem pobre, numa perspectiva do nosso tempo da economia
de especulação financeira em que a falta de dinheiro é vista como a
impossibilidade de agir, o que não aconteceria se a Igreja, como Pedro, não
tivesse prata nem ouro mas tivesse a força para dizer ao que coxeia Levanta-te e anda! - e não forçosamente ao
coxo fisicamente mas ao homem que caminha inseguro e sem esperança na estrada
da vida.
Embaixadores
do Crucificado
Cada
cristão, a Igreja como um povo, devem ter bem presente que o dinheiro que têm
está sob esta palavra vinda pelo profeta Ageu: Minha
é a prata, e meu é o ouro, disse o Senhor dos Exércitos. Ageu 2:8 O modo como
usamos o dinheiro que chega a nós tem de ter em conta que não somos, Igreja e
crente, senão mordomos, responsabilizados pelo património d'Aquele a Quem tudo
pertence Salmo 24:1.
O Senhor não se deleita com sacrifícios nem holocaustos mas quer que andemos de
coração quebrantado e contrito e que pratiquemos a justiça Salmo 51:16; Amós 5:24. Nesta
perspectiva, percebe-se, por exemplo, que não se trata de o cristão contribuir
com dez por cento dos seus proventos para a sua Igreja (prática do Antigo
Testamento), mas de se oferecer a si mesmo, oferecer tudo quanto tem e é. Mas
isto implica também, naturalmente, que as Igrejas devem ser altamente
responsáveis no modo como administram a “prata e o ouro” que lhes é entregue.
Tem sido escandaloso saber pelos meios de comunicação como Igrejas modernas
espoliam ingénuos com dízimos e ofertas generosas para que os seus pastores
vivam em casas ricas, transportando-se em carros de luxo e usufruindo salários
de executivos. O chefe de uma Igreja desse tipo apresentou-se para dirigir num
culto vestindo um fato caríssimo, de alta marca. Como alguém manifestasse
surpresa, explicou: “Não se admirem de me verem vestido como uma alta
personalidade, pois eu sou um embaixador do Deus Todo-Poderoso!”. O problema é
que o Senhor Todo-Poderoso veio a nós num homem comum, pobre e fraco, que
disse: Qualquer que entre vós quiser ser o
primeiro, será servo de todos. Porque o Filho do homem não veio para ser
servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos. Marcos 10:44/45.
É de Cristo crucificado que os cristãos são embaixadores Efésios 6:20. E é
só nessa perspectiva que a Igreja e os cristãos podem ser luz num mundo em que
Mamon é senhor.
1.5 – Mordomia – Um desafio para as igrejas do sul da Europa
De
autoria de Joel Cortés - Presidente da Comissão Executiva da Igreja
Evangélica Espanhola
Não
e a minha intenção fazer teoria sobre um tema que me manteve ocupado mais de 20
anos ao serviço da igreja, acho que pode ser mais interessante falar a partir
das realidades vividas e especialmente dos desafios que devemos afrontar nas
nossas igrejas a sul da Europa a partir do abandono da condição de igrejas
“tuteladas economicamente” pelas igrejas irmãs da Europa central durante muitos
anos.
São
muitas as coisas que necessitamos rever, assinalarei apenas três que me parecem
mais importantes.
-
Aproveitamento dos nossos recursos humanos e materiais.
-
Revisão da nossa implantação em todos os lugares e a procura activa de uma
maior colaboração entre as comunidades, chegando se necessário a uniões
físicas, a acordos ou a uma união de acções e serviços.
-
Reflectir profundamente sobre a Mordomia Cristã, não somente no sentido
tradicional marcado peio carácter económico, mas também o compromisso de tempo,
de entrega absoluta que nos exige o cumprimento da Missão.
É
evidente que toda a transformação deve efectuar-se a partir de uma rigorosa
análise da realidade, a visão de uma situação não proporciona os dados
actualizados, é preciso efectuar uma análise da nossa evolução tentando também
projectar no futuro o devir da igreja no seu conjunto (Igrejas, Missões e Obras
Sociais).
Aproveitamento
dos recursos humanos e materiais existentes
É
preciso partir da constatação de que a estrutura das igrejas minoritárias, que
surgiram e cresceram num contexto hostil, foi viabilizada economicamente com a
ajuda de outras igrejas que desde o princípio e durante muitos anos
contribuíram de forma muito significativa numa perspectiva de missão, Com o
passar do tempo estas alcançaram um estatuto de Igrejas independentes, no seu
aspecto organizacional e eclesiológico, sem no entanto eliminar a dependência
de carácter económico.
Entre
outros aspectos, a Igreja não desenvolveu uma lógica de aproveitamento do
património de que dispomos, e é preciso reconhecer que tudo está, única e
exclusivamente, ao serviço da sua missão como Igreja. Esta não tem ambições
materiais, nem de acumulação de poder ou riqueza, deve perseguir a utopia de
dispor dos meios estritamente necessários para o cumprimento dos seus fins.
Devemos reconhecer que a nossa situação actual dista muito desta utopia,
possuímos muitos templos com muitas possibilidades mas que são pouco
utilizados, nalguns casos por terem espaços demasiados grandes em relação à
actividade e membros das comunidades locais, que se traduz numas poucas de
horas de utilização semanal efectiva. Uma das tarefas que devemos impulsionar é
a revisão em profundidade do conceito de propriedade e do seu uso.
Outro
elemento de vital importância assenta no aproveitamento dos recursos humanos. A
existência de um bom número de comunidades, com um reduzido número de membros,
atendidas por um pastor a tempo inteiro não é sustentável a partir de qualquer
ponto de vista. Pensamos sempre em razões económicas que, evidentemente existem
e condicionam as possibilidades, mas para além destas poderíamos invocar razões
ainda mais transcendentes e a mais importante é o reconhecimento do direito e
da obrigatoriedade de todo o Ministro a ocupar-se plenamente na sua missão. É
certo que, no inicio, o trabalho não é directamente proporcional ao tamanho das
congregações mas é evidente que, a longo prazo, se não brotarem frutos tudo
resulta numa acomodação à realidade envolvente, criando-se sinergias negativas
entre pastor e comunidade.
Não
queremos renunciar a projectos de missão que sempre exigem que os meios estejam
na frente das necessidades, é o “trigo de semente” que toda a Igreja deve
semear, mas há um tempo para cada coisa e acontece que, por vezes, se não há
fidelidade aos planos originais, um projecto de missão se converte num projecto
de instalação.
Não
queremos deixar desatendidas as congregações mais pequenas e, portanto, com
menos recursos, contudo devemos procurar novas fórmulas para evitar que este
fenómeno não se dê na Igreja com tanta profusão. A procura de pastores que
possam compatibilizar a sua função pastoral com um emprego secular e o programa
de formação de leigos podem permitir dispor, no futuro, de recursos que
respondam ao princípio de sustentabilidade.
As
comunidades e a sua implantação
Este
enunciado muito sintético pretende abordar a situação estratégica de muitas das
nossas comunidades, particularmente em lugares em que as distâncias são muito
reduzidas, com algumas excepções, refiro-me a Madrid e Barcelona. Em ambas as
cidades mas sobretudo em Barcelona, convivem comunidades com um tamanho notável
em relação à média nacional, com comunidades com um tamanho muito reduzido que
apesar da nossa estrutura sinodal e solidária tem frequentemente sérias
dificuldades para conseguir os recursos necessários para a sua atenção
pastoral, para cobrir os custos correntes (mantimento de edifícios, etc.).
Uma
das tarefas a levar por diante é efectuar uma revisão em profundidade dos
vínculos de trabalho entre igrejas, num leque de medidas que podem ir desde a
partilha de pastores, a acordos de unidade de acção que resultem em programas
comuns e Conselhos comuns, até à plena união das comunidades.
Isto
não quer dizer que uma possível união das comunidades signifique abandonar
definitivamente os lugares de culto e zonas geográficas da cidade, pode
continuar a ser um terreno de missão e podem organizar-se actividades (cultos,
acções de evangelização, actividades culturais, obras sociais, etc.) que
garantam a presença da Igreja. Não consideramos imprescindível o mantimento das
propriedades tal como estão. Será também necessário desenvolver políticas
criativas que nos permitam adequar os meios aos fins em cada momento.
Neste
sentido é importante para a Comissão Executiva o desenvolvimento do “Programa
de Evangelização” que definimos já há alguns anos. Tomando como base uma
comunidade pequena a ideia é desenvolver um programa de crescimento, dotando-o de
um Pastor ou Pastora com uma reconhecida capacidade para o trabalho de missão e
evangelização para que, esta experiência, a partir de um trabalho sério e
rigoroso, seja um exemplo a ser retomado noutras comunidades.
Revisão
da Mordomia Cristã
A
constatação de que temos um grave problema de aproveitamento dos recursos
obriga-nos a convidar toda a Igreja a rever a sua praxis à luz da Palavra, da
História e da Teologia e somente assim seremos capazes de identificar as nossas
carências, o que nos falta para alcançar uma administração responsável dos bens
da Igreja. A percepção, muito estendida, de que se não alcançávamos os nossos
objectivos (especialmente os económicos), outros se encarregavam de os
resolver, cremos sinceramente que chegou ao fim.
Um
dos aspectos que é necessário assinalar é a percepção de que existe no seio da
Igreja um corte generacional em relação a importância da mordomia, os membros
de mais idade tem um sentido de responsabilidade maior em relação às novas
gerações. A manifestação deste fenómeno estende-se ao assumir de ministérios no
seio da Igreja, seja em relação a novas vocações no campo da pregação ou para
assumir responsabilidades na direcção das comunidades.
Iniciámos
um movimento, um processo de revisão da nossa realidade actual. E este é o
início do um caminho que dê à nossa igreja centenária um novo impulso, uma nova
maneira de encarar o testemunho. Frequentemente esquecemos que a Igreja
Evangélica Espanhola é reconhecida em muitos âmbitos externos como portadora de
grandes valores derivados das suas raízes eclesiológicas e teológicas, da sua
abertura, profundamente ecuménica, democrática e solidária. A nossa influência
no panorama protestante espanhol não assenta em critérios quantitativos, do
número de membros ou de comunidades é na realidade muito maior. Devemos
sentir-nos orgulhosos disso mas sobretudo devemos comprometer-nos até ao final
com a herança que recebemos daqueles que nos precederam.
O
que interessa é que eu chegue ao fim da minha carreira e cumpra o encargo que o
Senhor Jesus me deu, de pregar a Boa Nova do amor de
Deus. Actos 20:24
2 - Tentação do dízimo no protestantismo histórico (CC)
Li
os artigos sobre mordomia incluindo a contribuição monetária publicados no
número 932 do “Portugal Evangélico” (Março de 2009) e quero felicitar a
redacção da revista por esta iniciativa, pois trata-se dum assunto que muito
poucas vezes é abordado pelos pastores das igrejas do protestantismo histórico.
Embora
os artigos publicados nesta revista das igrejas Metodista e Presbiteriana de
Portugal possam ser livremente transcritos, desde que mencionada a sua fonte,
quero agradecer a amável autorização que me foi concedida para transcrever os
artigos na minha página na internet ao abordar um assunto de tanta importância
para as igrejas do protestantismo histórico em Portugal.
Atendendo
ao grande número de visitantes do Brasil que entram na minha página, peço ao
Senhor que estas reflexões possam levantar a mesma questão nas igrejas do
protestantismo histórico no Brasil.
2.1 - Artigo
“O Dízimo”,
do Pastor Brissos Lino, da Igreja do Jubileu de Setúbal
Começa
por afirmar que o dízimo é prática corrente das igrejas evangélicas, o
que suponho ser quase verdade nos EUA e no Brasil, mas não nas igrejas do
Protestantismo Histórico na Europa. Digo quase verdade, pois no Brasil há
igrejas do protestantismo histórico e até igrejas evangélicas que se mantêm
fiéis ao Evangelho da Graça e não aceitam a obrigatoriedade do dízimo.
Admira-me
a afirmação de que o dízimo era observado entre os povos antigos, como
justificação para a doutrina da obrigatoriedade do dízimo para os cristãos,
pois muitas vezes tenho ouvido sérias críticas à Igreja Católica e acusações de
ter sofrido influência do paganismo, incorporando na sua teologia alguns desses
antigos conceitos, que já existiam antes de Moisés. Será que neste caso a tal
influência do paganismo já é tolerável se forem igrejas evangélicas?
O
argumento de que o dízimo não foi revogado por ser anterior à Lei de Moisés,
parece-me extremamente perigoso, pois o mesmo argumento também poderia ser
aplicado à escravatura, pena de morte, forte discriminação da mulher e muitas
outras atitudes que também eram observadas entre os povos antigos e mais
tarde foram integradas na Lei de Moisés.
Se
o dízimo que Abraão deu a Melquisedeque é um exemplo para os cristãos, então
esperemos que estes tenham algum despojo duma guerra para entregar um décimo à
igreja, só uma vez na vida, pois não nos consta que Abraão tenha tirado um
décimo dos seus rebanhos ou de outros dos seus bens pessoais, nem que voltasse
todos os meses ou todos os anos para entregar o dízimo a Melquisedeque.
Discordo
da afirmação de que A igreja é o conjunto dos fiéis, e não o edifício,
afirmação que parece estar na moda entre certos pastores. O simples facto do
significado etimológico da palavra ser um conjunto de pessoas (não necessariamente
crentes), não permite limitar o significado da palavra só a esse caso, nem nos
impede que possamos chamar igreja ao edifício. Sobre o assunto, aconselho a ler
o meu artigo Igreja ou
templo da rua tal… (CC)
Ao
ler a afirmação de que Contribuir para o sustento do centro de adoração é
mais do que um dever do cristão, é um verdadeiro privilégio, pois torna os
fiéis participantes da Obra, verdadeiros cooperadores de Deus, não posso deixar
de lamentar como tais igrejas estão longe do verdadeiro cristianismo. Segundo
Jesus afirmou em Mateus
7:15/23, há lobos ferozes que se apresentam como pastores, mas é pelos seus
frutos que os podemos distinguir.
Infelizmente
é esta a mentalidade da maioria das igrejas evangélicas dos nossos dias em que
nalguns países há milhares que morrem à fome, enquanto essas igrejas só estão
preocupados com a construção de centros de adoração, igrejas (edifícios)
e sustento pastoral, que ele não mencionou. A ajuda aos necessitados da grande
maioria das igrejas evangélicas é uma percentagem insignificante a comparar com
as verbas destinadas ao sustento pastoral e construção de templos.
Há
páginas da internet, como por exemplo http://www.noticiascristas.com/2009/03/curso-ensina-pastor-ser-empresario-da.html
que ensinam pastores a ser “Empresários da Fé” e divulgam algumas das frases
feitas e argumentos utilizados neste artigo do Pastor Brissos Lino. Aconselho a
leitura dos outros artigos desta minha página da internet, na secção Temas polémicos, onde
este assunto da obrigatoriedade do dízimo nos nossos dias é apresentado com
maior desenvolvimento, em vários artigos de vários autores.
2.2 - Artigo
Dízimo, preceito cristão? De autoria do
Pastor Alderi Souza de Matos, Doutor em história da Igreja pela
Universidade de Boston.
Embora
discorde da conclusão final deste autor, penso que é um estudo sério e começa
por afirmar que: A prática do dízimo é um tema controverso nas igrejas
evangélicas, tendo, de um lado, defensores apaixonados e, do outro, críticos
ardorosos. O que vem contrariar a afirmação que encontramos no primeiro
artigo que transcrevemos
Quero
realçar as seguintes afirmações deste artigo, a que dou o meu acordo:
O
dízimo previsto no Antigo Testamento era destinado especificamente para o
sustento dos levitas. Números 18:21/24
Nos
escritos do Novo Testamento, o dizimo é mencionado explicitamente apenas nos
Evangelhos e na epístola aos Hebreus, sempre em relação aos judeus.
No
início da igreja ….. Não havia templos nem ministério a tempo integral (muitos
líderes eram “fazedores de tendas”, como Paulo). A maior carência estava na
área social ou beneficente.
Ao
longo dos séculos, ele (o dízimo) tornou-se
obrigatório.Isto é verdade,
mas tornou-se obrigatório só em certas igrejas que se desviaram da genuína mensagem
do Evangelho, em especial as igrejas de influência americana ou brasileira,
pois há outras que não aceitam a obrigatoriedade do dízimo, entre elas a Igreja
Católica, que neste assunto tem mostrado uma maior seriedade.
O
autor do artigo apresenta em seguida, vários argumentos para provar a
necessidade da obrigatoriedade do dízimo nos nossos dias.
Mas
terão as igrejas autoridade para recuperar um ou mais preceitos da Velha Lei
que foi abolida por Cristo? Certamente que não foi uma decisão de toda a Igreja
Cristã, e possivelmente, nem uma decisão democrática de cada Igreja
isoladamente, aprovada em assembleia de Igreja, mas simples decisão de alguns
dos seus dirigentes, movidos pela sua ambição pessoal.
Não
tenho dúvidas de que em casos excepcionais, as igrejas poderão pedir que os
crentes aumentem os seus donativos, mas não vejo base bíblica para que possam
acrescentar alguma coisa aos mandamentos que Cristo nos deixou.
Como
já afirmei, duma maneira geral concordo com a apresentação do Pastor Alderi
Souza de Matos, mas não com a sua conclusão, nem quando afirma que: A
questão do dízimo é tão difícil para muitos cristãos, porque toca numa parte
sensível da sua vida – o bolso. Esta é mais uma das muitas frases feitas,
que já ouvi muitas vezes para pressionar os crentes a contribuir. Afinal, quem
lucra com a lei do dízimo? Para onde vai a maior parte das verbas arrecadadas?
Não é para o bolso desses pastores?
Eu
sou dos que consideram excessivo entregar 10% às igrejas, quando em alguns
países há pessoas a morrer à fome. Já me tem acontecido estar indeciso entre
dar às igrejas ou à ONG “Médicos sem fronteiras” ou outras organizações no
género e penso que os donativos são mais bem entregues a essas ONGs se forem
sérias.
No
Velho Testamento estavam numa sociedade cívico religiosa e o dízimo era
praticamente o seu “imposto único”, para sustento dos levitas, como afirma
Alderi de Souza de Matos, (a) embora em certos
casos houvesse outros impostos, como no caso dos direitos alfandegários
cobrados pelos romanos no tempo de Jesus.
Nós
pagamos muito mais impostos, mas também recebemos mais benefícios do nosso
Governo. Não é fácil comparar culturas tão diferentes, mas estabelecendo um
paralelo de ideias, mesmo que aproximado, com a nossa realidade, se
considerarmos que o total de todos os dízimos que os judeus pagavam ao Templo
de Jerusalém, corresponde ao nosso Orçamento Geral do Estado, podemos ver que (b) esse valor dos 10% é muito superior ao que recebe
a grande maioria dos Ministérios do nosso Governo.
Para
terminar o comentário a este artigo do Pastor Alderi Souza de Matos, quero
dizer que discordo da interpretação que dá a Marcos 12:41/44
que aliás é a interpretação tradicional geralmente utilizada pelos pastores
para incentivar a contribuição, ignorando o contexto dessa parábola. Sobre o
assunto, aconselho a leitura do meu artigo Oferta da viúva pobre
(CC)
2.3 - Artigo
Dar a Deus o que é de Deus… de autoria da
Pastora Eva Michel
Como
a própria Pastora Eva Michel afirma, não gosta de falar de dinheiro, e
aqueles que a conhecem, bem sabem que esta minha antiga Professora de teologia,
que é Pastora mas, tal como Paulo, tem uma profissão secular, não está
habituada a abordar estes assuntos. Mas levanta importantes questões sobre o
título que deu ao seu artigo, acabando muito sabiamente, por não definir
concretamente o que é de Deus, nem como podemos dar a Deus, pois isso
fica à reflexão dos leitores no desenvolvimento das valiosas pistas de reflexão
que nos deixou, nomeadamente os graves problemas sociais, quer a nível mundial
dos milhões sem água potável, quer até a nível das nossas igrejas, com a grave
crise económica que atravessamos.
Talvez
eu tenha sido mais sensível a este problema da água potável, pois durante
muitos anos fui o engenheiro responsável pelo abastecimento de água ao Concelho
da Marinha Grande onde moro e que hoje está praticamente abastecido a 100%, mas
o mesmo não acontece em todos os Concelhos de Portugal e em muitos outros
países, por vezes nem água imprópria têm, para poderem sobreviver.
Parece
que os antigos se preocupavam mais com estes problemas que os crentes da
actualidade. Algumas igrejas, fruto da Missão Metodista de Cambine, em
Moçambique, começaram com um furo de captação de água, que serviu de pólo de
atracção das populações.
A
leitura deste artigo suscitou-me ainda outras questões: Dar a Deus é entregar
às igrejas? A responsabilidade de quem dá a Deus, termina com a entrega da sua
oferta? Ou a responsabilidade continua até saber qual o destino final da sua
oferta?
Poderia
subscrever este artigo desta minha antiga Professora de teologia quase a 100%,
excepto a referência que faz à “Oferta da viúva pobre”, pelos motivos que já
referi.
2.4 - Artigo
A Igreja e o dinheiro: Fundamentos bíblicos
do Pastor Manuel Pedro
Cardoso
O
Pastor Cardoso, meu antigo Professor de teologia, e um dos principais
colaboradores desta página na internet, já há muito nos habituou à seriedade
dos seus artigos, correcto posicionamento teológico e abertura a outras
posições, mesmo que divergentes, desde que bem fundamentadas.
Numa
época em que muitos procuram apresentar a lei do dízimo com base em passagens
do Velho Testamento, é importante meditar no que o Pastor Cardoso considera as bases
para uma séria abordagem do assunto e a que voltarei a referia-me nas
conclusões deste meu artigo.
2.5 -
Artigo Mordomia – Um desafio para as igrejas do sul
da Europa de autoria de Joel Cortés, Presidente da Comissão
Executiva da Igreja Evangélica Espanhola.
Trata-se
dum importante artigo que penso complementar o artigo do Pastor Cardoso que
apresenta as bases de reflexão enquanto o artigo de Joel Cortés aborda os seus
aspectos práticos mais em pormenor, com base na sua valiosa experiência a que
mais adiante nos iremos referir.
Como
afirma Joel Cortés, as igrejas minoritárias surgiram a cresceram num
contexto hostil. Penso que este facto levou a que se tornassem igrejas um
tanto isoladas da comunidade envolvente, mentalidade que tem de ser ultrapassada
com um melhor aproveitamento dos seus “espaços”. O conceito de igrejas como um
“espaço fechado” e isolado do exterior, tem mais a ver com um conceito
veterotestamentário do “lugar santo” e “lugar santíssimo”, que não tem bom
fundamento neotestamentário. Santos devem ser os crentes, e a igreja (edifício)
deve ser um “espaço aberto”, um “edifício público” onde todos possam entrar sem
se sentirem estranhos, um “espaço” que esteja ao serviço da comunidade com
outras funções além da actividade religiosa. Já foram efectuadas algumas
iniciativas nesse sentido, com bons resultados. (Estou a lembrar-me da Igreja
do Bebedouro). O importante é haver um certo bom senso para que se mantenha o
ambiente salutar duma igreja dos nossos dias, sem os exageros dos antigos. Se,
como diz o Pastor Cardoso, a Igreja se deve guiar pelo pensamento e exemplo de
Cristo, não podemos ignorar que o nosso Mestre não foi homem de igreja ou homem
de sinagoga, muito menos do Templo de Jerusalém, que era o lugar dos seus
inimigos, e os seus principais ensinos, foram divulgados nos campos, nas
praias, nos montes, lugares que hoje diríamos, em ambiente secular.
O
apoio económico das igrejas do norte da Europa, foi muito valioso para as
igrejas protestantes do Sul que certamente ficaram para sempre gratas por essa
ajuda, mas não podemos ignorar alguns dos aspectos negativos dessa ajuda
económica. Talvez essa ajuda se tenha mantido durante demasiado tempo e não
terminou na altura mais indicada, pois acabou por criar uma mentalidade de
dependência económica e um certo alheamento dos problemas económicos, dando
origem a que os seus pastores no presente não saibam bem como abordar o
problema.
3.1 – O dízimo no nosso contexto histórico e cultural
Todos
sentimos que estamos numa época de grandes mudanças, talvez estejamos no virar
do século. Não me refiro ao tempo cronológico, mas a uma mudança do ambiente em
que vivemos, e assim, penso que agora é que estamos entrando no século XXI. É
natural que terminem as ajudas financeiras ao protestantismo do sul da Europa,
pois a divisão entre países ricos e pobres está mudando rapidamente. Assistimos
há poucos dias à reunião dos G20 em Londres em que vimos alguns novos
participantes que no passado eram países pobres, e outros que ainda fazem parte
do grupo dos países ricos e se comportam como tal, continuam a falar como se
fossem os dirigentes do mundo, embora já estejam num declínio irreversível,
talvez até numa falência económica e sem possibilidade de pagar as suas
dívidas.
Mudou
o mundo em que vivemos. Temos melhores meios de comunicação e de transporte,
pelo que já não faz sentido haver várias congregações da mesma igreja numa
mesma cidade, salvo o caso de Lisboa ou Porto ou se as diferentes congregações
forem fruto de insuperáveis diferenças teológicas ou culturais, como por vezes
acontece em congregações da mesma igreja, pelo que nos parece pertinente a
sugestão de Joel Cortés, de juntar, sempre que possível, várias congregações
duma mesma cidade, atendendo à maior facilidade com que os crentes se deslocam
utilizando os seus meios de transporte ou os transportes públicos. O assunto
até faz lembrar o que acontece com a redução do número de escolas primárias nos
meios rurais.
A
época dos grandes ajuntamentos, para ouvir a pregação dum orador que sobe ao
alto do púlpito, que no passado era praticamente a única forma de transmissão
da mensagem do Evangelho a grandes grupos de pessoas, já foi ultrapassada pela
imprensa que tornou o custo dos livros acessível a todos, pelos outros meios de
comunicação, nomeadamente a rádio, a TV, e no presente pela internet que já é
uma realidade em grande parte das famílias portuguesas. Nos nossos dias
praticamente todos sabem ler, têm possibilidade de ter uma bíblia a preço
acessível e temos estes outros meios mais eficientes para divulgar a mensagem
cristã, que não estão a ser devidamente utilizados, como alerta o Pastor
Cardoso. Talvez ele próprio se irá admirar do que vou dizer, mas o Pastor
Cardoso é dos principais colaboradores da minha página na internet, pois 14 %
artigos que temos actualmente, são de sua autoria. Nesta altura o aparelho de
estatísticas do servidor de internet está avariado, mas antes desta avaria
registava mais de mil visitantes por dia, tendo alcançado os dois mil em certas
épocas do ano, pelo que, considerando só o valor mais baixo e admitindo que
cada visitante só lê um artigo, podemos afirmar que em média, cerca de 140
visitantes lê pelo menos um artigo do Pastor Cardoso por dia.
Penso
que a comunicação do Evangelho nos grandes ajuntamentos, apela mais à emoção e
menos à reflexão. Certo tipo de crentes, entre os quais me incluo, prefere ler
numa revista ou na internet, a assistir pessoalmente ou na TV, pois na leitura
duma mensagem podemos voltar atrás, esmiuçar cada afirmação, e não somos
pressionados pela emoção, que também faz parte do Evangelho, mas se for em
exagero bloqueia o raciocínio.
A
divulgação de opiniões sobre assuntos que mobilizem a opinião pública através
da internet é eficiente e de baixo custo. Claro que para captar a atenção do
público, terão de ser abordados assuntos que mobilizem a opinião pública, não
poderão ser somente os tradicionais artigos sobre a paz ou o amor. Afinal, qual
a religião dos nossos dias que não diz que Deus é amor?
Não
basta falar no amor de Deus e explorar os mais ingénuos que geralmente são os
mais pobres. O que o nosso mundo necessita urgentemente é de igrejas que não só
falem no amor de Deus, mas também o demonstrem pelas suas obras.
Os
problemas económicos, também não são exclusivos da Igreja e dos pastores. Têm
de ser ponderados num contexto mais vasto da época em que vivemos, em que
muitas profissões estão desaparecendo ou adquirindo novas funções, que obrigam
a que qualquer profissional esteja em permanente actualização. Não sei quanto
as igrejas do Protestantismo Histórico têm investido nos últimos vinte anos, na
formação e actualização dos seus antigos pastores.
Se
Igreja é onde dois ou três se reunirem em nome de Jesus, talvez a crise não
seja propriamente da Igreja, mas da forma de ser Igreja adoptada pelas igrejas
dos nossos dias, com um Pastor que é o dirigente, e um grupo de membros que se
limita a assistir passivamente. É assim que tem acontecido através dos tempos e
agora a maior parte das congregações não consegue sobreviver se não tiver
Pastor. Se a falta de pastores obrigar a mudar esta mentalidade, darei graças a
Deus pela crise da falta de pastores. Aliás, na Igreja Católica há o mesmo
problema e tenho notado que há cada vez menos católicos praticantes mas
melhores católicos, mais esclarecidos e com mais maturidade.
A
maior parte dos crentes das igrejas do protestantismo histórico em Portugal,
vive alheia aos problemas económicos das suas igrejas e é urgente que tal
assunto seja amplamente debatido em escolas dominicais participativas para
adultos, ou reuniões tipo “mesa redonda” onde todos possam e devam intervir, ou
de preferência por contactos pela internet, de que sou um entusiasta, pois na
internet não há limite de “espaço”, cada um dá o desenvolvimento que entender,
nem há possibilidade de sermos interrompidos ou de nos ser cortada a palavra,
nem há tempo limite para responder e podemos demorar o tempo que for necessário
para estudar, orar e meditar no assunto calmamente em casa, sem pressões
psicológicas do número de pessoas que defende determinada posição teológica,
além de ser possível “juntar” todos os membros de determinada igreja, sem que
tenham de se deslocar a determinado local, desde que tenham a sua ligação à
internet, ou de algum amigo ou familiar.
3.2 - Problema económico – Duas atitudes opostas
Actualmente,
os problemas financeiros que já se sentiam nas igrejas, têm-se agravado pela
crise económica que tem afectado o nosso país e todos procuram uma solução.
Vejo
que em Portugal, assim como já aconteceu no Brasil, há uma certa pressão para
que se adoptem os mesmos métodos da grande maioria das igrejas evangélicas para
a resolução dos problemas económicos. Refiro-me a colocar em vigor a lei
veterotestamentária da obrigatoriedade do dízimo.
Não
digo que não dê bons resultados contabilísticos, mas nem tudo que resulta sob o
aspecto económico tem o apoio do Senhor. Não podemos olhar para os resultados
económicos de certas igrejas que exploram os seus crentes e dizer que tais
resultados são a resposta do Senhor, pois poderão pelo contrário, ser a
resposta de Satanás.
Essa
tendência é para a utilização duma “ginástica hermenêutica” mais que duvidosa
para colocar um preceito da Velha Lei em vigor nos nossos dias, com argumentos
vulgarmente aceites pela maioria das igrejas evangélicas, que são fruto da
cultura pragmática e materialista dos EUA, a mesma cultura que deu origem à
actual crise quase mundial, que não é só financeira, mas afecta também outros
valores, incluindo a teologia. Não podemos aceitar essa mentalidade que coloca
os objectivos económicos em primeiro lugar e está pronta a sacrificar os
valores do Evangelho, mesmo os que são inegociáveis, como a abolição total e
definitiva da Velha Lei de Moisés. Parece que a maior parte das igrejas
evangélicas, na América e no Brasil, aceitaram o desafio de Satanás. “Posso dar-te todo este poder e toda esta grandeza, porque
tudo isto me foi entregue a mim e eu dou-o a quem eu quiser. Tudo será teu, se
me adorares.” Lucas 4:5/8
Não
encontrei nenhuma referência ao dízimo nas Institutas de Calvino e duvido que
Lutero, que reagiu à exploração da crendice popular, alguma vez se tenha
referido ao dízimo neotestamentário, como forma de “rentabilizar” a Igreja,
doutrina que tem contaminado igrejas evangélicas em todo o mundo,
principalmente as que estão nas zonas mais pobres do Brasil, pois os mais
pobres geralmente são os menos cultos e mais vulneráveis a este tipo de exploração.
Mas
há outra atitude possível perante a crise nas nossas igrejas. Não podemos
esquecer de que, como diz o Pastor Cardoso, citando 1ª Coríntios 12:27
a Igreja é o Corpo de Cristo e o seu modo de pensar e agir têm de ser
determinados pelo modo de pensar e agir do Senhor, conforme nos é revelado nas
Escrituras. Falar da atitude que a Igreja ou os cristãos individualmente devem
ter em relação ao dinheiro é falar da atitude que Cristo tem nos Evangelhos em
relação ao mesmo assunto, porque ser Igreja de Cristo é ser o povo que segue a
Cristo.
Como
vimos, o Pastor Cardoso cita a passagem do capítulo 10 de João em que o crente
é comparado à ovelha. Mas penso que a ovelha do Senhor tem uma característica
importante. É que ela conhece o Bom Pastor e não se deixa enganar facilmente.
Contaram-me
que certo dia, um irmão do Brasil, também colaborador desta nossa página,
enquanto conduzia o seu carro a caminho do trabalho, falando da exploração do
crente na sua igreja, afirmou à sua esposa: Já não sou ovelha do Senhor…
agora sinto-me como ovelha do meu pastor e o meu trabalho é dar lã e estar
calado.
Como
afirma o nosso antigo Professor de teologia, o leitor da Bíblia não tem
dificuldade em perceber que estava certa a Teologia da Libertação quando falava
da “opção de Cristo pelos pobres” e da consequente necessidade de que a Igreja
não seja apenas uma Igreja com os pobres ou para os pobres, mas de ser a Igreja
pobre e dos pobres.
Penso
que foi essa a opção de João Batista, antes mesmo do ministério de Cristo
segundo afirmo no meu artigo João Batista (CC). Ele
não necessitava de igreja (edifício), nem de grupos de louvor ou grandes
corais, nem fazia curas nem milagres, mas o povo vinha em multidão para o
ouvir, pois as ovelhas do Senhor, bem sentem a Sua Voz quando a genuína
mensagem é apresentada.
João
Batista nada pedia para si, mas exortava os seus seguidores a partilhar dos
seus bens entre si. Quem tiver duas túnicas…
No
entanto, quanto ao dízimo, nem todas as igrejas se desviaram do verdadeiro
Evangelho. Posso citar o caso da Igreja Católica, que neste assunto tem uma
posição mais séria, assim como algumas poucas igrejas evangélicas, bem como as
igrejas do protestantismo histórico na Europa, que duma maneira geral se mantêm
fiéis ao Evangelho e onde gostaria de continuar a incluir as nossas igrejas
Presbiteriana e Metodista.
4 - Conclusão
Para
terminar estes comentários à leitura do último número da revista “Portugal
evangélico”, devo dizer que:
1)
Concordo e apoio a decisão de se falar em mordomia incluindo e contribuição
monetária. Não é de admirar que essa contribuição seja fraca nas igrejas do
protestantismo histórico, pois é assunto que tem sido ignorado e muitos dos
seus membros desconhecem os graves problemas económicos das suas igrejas.
2)
Um assunto desta importância, que pode afectar as bases da mensagem do Mestre,
terá de ser debatido por toda a igreja. Já não é tolerável nos nossos dias que
a “igreja docente” ou um grupo de pastores decida o que devem “ensinar” aos
leigos, ignorando a interpretação do povo de Deus e a Tradição Reformada. Nem o
termo “igreja docente”, nem o que tal significa, utilizando outras expressões,
tem lugar na teologia reformada, muito menos nos nossos dias.
3)
A opinião dos leigos não pode ser vista como alguma “coisa” que pode ser
moldável segundo uma estratégia pré-definida.
4) É lícito e desejável incentivar a contribuição, mas nem todos os meios para incentivar a contribuição financeira são aceitáveis, pois alguns ultrapassam a “fronteira” entre cristianismo e judaísmo. Há doutrinas do cristianismo que são inegociáveis.
5)
Quando os judaizantes tentaram colocar em vigor a lei da circuncisão, segundo
vemos nos capítulos 3 e 5 de Gálatas, Paulo reagiu afirmando (tradução da Boa
Nova): Ó gálatas sem juízo! Quem foi que vos
enganou? Eu tinha-vos feito ver Jesus Cristo crucificado. Só quero que me digam
isto: vocês receberam o Espírito de Deus por terem cumprido a lei, ou por terem
aceitado a fé?...... Cristo libertou-nos, para sermos realmente livres.
Portanto, permaneçam firmes e não voltem mais a ser escravos. Eu, Paulo,
digo-vos que se recebem a circuncisão, Cristo não vos servirá de nada.
Será
que Paulo seria mais tolerante, quando o Evangelho é deturpado para
rentabilizar a Igreja? Quando os objectivos económicos são colocados em
primeiro lugar? Quando as exigências da igreja deixam de estar ao alcance de
muitas famílias em dificuldades económicas?
Portanto, defendo por um lado o reforço das contribuições para as
nossas igrejas do Protestantismo Histórico, e por outro, uma defesa
intransigente do Evangelho da Graça com rejeição da Velha Lei de Moisés,
nomeadamente a obrigatoriedade do dízimo.
Camilo – Marinha Grande,
Portugal
Maio
de 2009
(a). Joaquim Jeremias refere-se ao “imposto da didracma” Êxodo 30:13, Mateus 17:24/27
(b) Segundo informação publicada no Diário da República
252 de 31 de Dezembro de 2008, o orçamento do nosso país para o corrente ano de
2009 foi o seguinte, em milhões de euros http://dre.pt/pdfgratis/2008/12/25201.pdf ( páginas
9300-84/87)
Ano económico de 2009
Encargos Gerais do Estado 3 164 milhões
de euros
Presidência do Conselho de
Ministros 208
Negócios Estrangeiros 337
Finanças e Administração Pública 127 640
Defesa Nacional 2 072
Administração Interna 1 765
Justiça 1
297
Ambiente do Ordenamento do
Território 253
Economia e Inovação 150
Agricultura
486
Obras Públicas Transportes e
Comunicações 209
Trabalho e Solidariedade
Social 6 939
Saúde 8 261
Educação 6
652
Ciência Tecnologia e Ensino
Superior 1 736
Cultura
158
Total 161 327
Não é fácil estabelecer uma
comparação da nossa realidade com os impostos do Velho Testamento, pois além do
dízimo, segundo Joaquim Jeremias informa no seu livro “Jerusalém no tempo de
Jesus”, eles pagavam a didracma e também o cumprimento dos seus votos. No nosso
caso, também os nossos impostos não são uma % fixa. Duma maneira geral, os
ricos pagam uma % mais elevada, o que me parece mais justo que o sistema
bíblico veterotestamentário dos 10% para todos. Mas vamos admitir que o
Orçamento Geral do Estado, que se baseia nos nossos impostos, representa 40% do
que todos os trabalhadores ganharam em Portugal.
Se 40% do nosso rendimento
colectável é de 161 327 milhões de euros, 10% que é o valor que daria se todos
os portugueses fossem dizimistas, seria o valor de 161 327 / 0.4 x 0.1 = 40 332
milhões de euros, valor só excedido pela verba destinada ao Ministério das
Finanças e Administração Pública.
Penso que seria um escândalo as igrejas
receberem 4.9 vezes mais que o Ministério da Saúde, ou 6 vezes mais que o Ministério
da Educação, ou 23 vezes mais que o Ministério da Ciência e Tecnologia. Não sei
se alguma vez, nas épocas do maior obscurantismo medieval, a Igreja Católica
terá arrecadado verbas tão elevadas. Mas foi devido a problemas semelhantes, em
que o povo era sobrecarregado de impostos, que nasceu a Reforma Protestante.
Certamente que esta não foi a única causa, mas foi certamente das principais.
Será que “está na hora” duma nova reforma, desta vez das igrejas evangélicas?
Bem sei que o caso vulgar do Protestantismo
português é o de pequenas igrejas, com poucos crentes que tentam manter um
Pastor a tempo integral, resultado das muitas divisões do protestantismo. Mesmo
assim, admito que as igrejas possam pedir um esforço de contribuição aos seus
crentes. Mas este pormenor vem mostrar que, se houvesse uma Lei do dízimo,
seria escandaloso, neste contexto, no Orçamento para o nosso país, aparecer um
“Ministério da Religião” com uma verba de 40 332 milhões de euros.
Não tenho dúvidas em afirmar que o valor de 10%
exigido por certas igrejas é demasiado, além de não ter base bíblica
neotestamentária.
NOTA: Quaisquer comentários a este artigo, para
eventual publicação, caso contenham argumentos pró ou contra a obrigatoriedade
do dízimo nos nossos dias, que ainda não tenham sido divulgados nos vários
artigos desta página, poderão ser enviados para o autor deste artigo, com a
identificação do remetente, incluindo nome, idade, igreja, cargo que desempenha
nessa igreja, preparação cultural e teológica e outras informações que nos
queira enviar, salvo se já for colaborador da Estudos bíblicos sem fronteiras
teológicas.
Veja
outros artigos sobre a doutrina do dízimo em Temas polémicos nesta
página da internet.
COMENTÁRIOS RECEBIDOS
Osni de Figueiredo. Pastor da Assembleia de Deus de Belenzinho, Distrito de Belém, no Estado de São Paulo – Brasil
Prezado
irmão Camilo.
Cada
vez mais me orgulho de seu desempenho em defesa da sadia interpretação bíblica.
Muito
valoroso é este debate que vem desmascarar velhos engodos e argumentos
decorados de afirmações falaciosas.
Oxalá
a luz do temor de Deus e da investigação bíblica ilumine os ingénuos e cesse a
loucura dos exploradores que se fartam do sangue destes.
Esta
causa é disputada em todo o mundo, porém no Brasil é algo que chega a ser
cruel, como ousou comentar uma vez um certo pastor daqui “Estar desempregado
não é desculpa para ser infiel ao Senhor (nos dízimos), não esta
comendo? Então tem dízimo”.
Quando
sinto a tristeza da perseguição por defender esta bandeira, me lembro das
agruras que deve ter passado o reformador Ulrich Zwinglio que também defendia esta entre outras e me sinto
um pouco herói.
Paz
Osni de Figueiredo –
Belém, São Paulo, Brasil
Maio
de 2009
Alceu
Braga alceubraga@yahoo.com.br Paraná –
Brasil. Crente indenominacional de 51 anos de idade e
8 anos de experiência nas igrejas. Não é membro de nenhuma igreja evangélica,
embora pertença à Igreja do Senhor. Exerce a profissão de vendedor autônomo.
Caro
irmão Camilo,
Enquanto
lia este seu artigo, procurava vislumbrar a posição de seus autores e já vinha
à mente, meu entendimento que julgo estar se solidificando com o auxílio de
sérios estudos que encontro na “Estudos bíblicos sem fronteiras teológicas”,
tendo estes vindo de encontro, de maneira inequívoca, aos seus fantásticos e
felizes comentários a respeito dos artigos relatados.
Querido
irmão Camilo, assim o chamo, com respeito e forma de expressar carinhosamente
meus agradecimentos, a supor ter ao meu lado, um amigo pronto a ouvir e
entender, mesmo que surjam divergências em alguns aspectos; e assim, surgindo,
quero participá-los.
Camilo,
não tenho formação teológica mas imensa vontade em iniciar algum curso na área,
poderia comentar alguma coisa? Ando temeroso quanto às tendências pois a única experiência
foi um ano de curso fornecido por uma igreja, onde se questionasse algo
(contrário ao que ensinado) era coisa do diabo. Isto aborrece!
Grande
abraço,
Alceu
– São José dos Pinhais, Paraná – Brasil
Maio
de 2009.
Caro
irmão Alceu
O
incentivo que lhe deixo é o estudo da teologia, o que é muito mais importante
do que ter um curso de teologia, pois o valor do diploma dum curso depende
muito da escola que o passou. Não sou brasileiro, mas sei que a maior parte
desses “cursos” evangélicos não são reconhecidos pelo Ministério da Educação do
Brasil.
Não
podemos confundir a séria meditação e investigação teológica com a simples
mentalização doutrinária, em que não há oportunidade para pensar, e o “bom
aluno” é o que repete tudo que o professor lhe “ensinou”, como aconteceu com o
caso que refere, em que nada podia questionar. Há Seminários que só aceitam
alunos propostos por um pastor, o que já indica o tipo de aluno disposto a tudo
aceitar sem questionar, e preferem os alunos de menor preparação cultural, pois
o futuro pastor que não tenha outra profissão, será certamente o mais fiel à
sua igreja.
Como
o irmão já tem certa experiência, é pessoa casada e com filhos, certamente que
está a pensar num curso por extensão, através da internet. Eu não conheço os cursos
disponíveis no Brasil. É fácil localizá-los pelos aparelhos de busca da
internet, mas nada posso dizer quanto ao seu valor.
Eu
nunca terminei nenhum curso de teologia, pois nunca ambicionei ser pastor, mas
o que fiz, foi o seguinte: Primeiro tentei estudar hermenêutica, antes mesmo de
iniciar o estudo da teologia, e depois tirei algumas cadeiras num Instituto
Bíblico fundamentalista e repeti mais ou menos as mesmas cadeiras no Seminário
ligado à Igreja Presbiteriana de Portugal, que é mais liberal, para ver as
diferenças. Tudo em cursos por extensão, em que o aluno enviava os seus
trabalhos pelos correios ou pela internet. Julgo que essa seria uma boa opção
para o irmão não estar na posição de simples receptor de informação sem a
questionar e não ser influenciado pelos professores sem a sua crítica pessoal.
Infelizmente, esse curso por extensão da Igreja Presbiteriana de Portugal já
não funciona, o que lamento, pois pela internet certamente que teria alguns
alunos interessados. Mas certamente que haverá outras hipóteses no Brasil, de
Seminários de teologia ligados a igrejas sérias.
Que
o Senhor o oriente nessa busca.
Com
um abraço fraternal do Camilo
David Oliveira Goiânia Brasil
Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes,
façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima. Hebreus 10:25
Há
muito mais diferenças que semelhanças entre “congregações” e “instituições
religiosas”. “Congregação” tem como principal fundamento perceptível, o ajuntar-se para as estimulações
recíprocas, sem a fixação preocupativa do local
físico, pois as portas residenciais eram francamente abertas para o
“ajuntamento”, a que chamavam “Eklesia”. Essa
preocupação é o âmago de todas as questões do chamado meio evangélico atual. As
instituições religiosas demandam um aparato organizacional e faz com que o
lugar do congregar-se seja muito custoso e complexo.
Sempre
digo que a “Igreja” atual, aquela “fixada” muito mais no local físico, (apoio
logístico da congregação cristã) não precisa de “dízimos”, mas de “dinheiro”
para a sua sustentação. Esse “dinheiro-dízimo” não tem nenhuma sustentação
bíblica, pois não se compara com o conceito bíblico de dízimo.
David
www.barramento@yahoo.com.br
Maio
de 2009
Obrigado
caro David
O
teu comentário suscita outra questão muito importante: O que é, ou o que deve
ser um igreja cristã? Fizeste lembrar-me de afirmações semelhantes que já tenho
ouvido não só aqui em Portugal, como em muitos outros locais bem distantes.
Disse-me um Pastor indiano na Índia, que a Eklésia
começou nos lares dos crentes, em pequenos ajuntamentos, e depois das grandes
organizações religiosas, perderem a sua credibilidade e se desfizerem em
escândalos e contendas, a Eklésia voltará para os
lares, quando Cristo voltar.
Parece
que esse tal pensamento é como o DNA ou ADN do cristão
que não nos pode deixar felizes com a situação actual das igrejas e nos faz
desejar alguma coisa diferente que não sabemos bem o que seja, mas sabemos que
já foi uma realidade da qual nos afastamos.
Talvez
o David, ou esse Pastor indiano que também é leitor da nossa página, ou algum
dos outros que sentem o mesmo problema, queira desenvolver o assunto.
Camilo
Afonso Felício Porto, Portugal
Caro Amigo Camilo. Obrigado pelo envio
destes artigos, apresentados por diversos Autores, que com o seu saber ajudam a
formar ou consolidar uma opinião.
É sempre oportuno voltar a este assunto,
para se não perder o valor da contribuição para as Igrejas e conhecer os seus
fundamentos e cada um avaliar o que lhe vai na mente e no coração.
Para mim, este assunto é já um assunto
pacífico, até porque sei que nenhuma Igreja pode manter a sua organização, se
não tiver um suporte financeiro, que ofereça uma regularidade à vida do
Ministério da Pregação e a outros ensinos necessários à vida de uma comunidade
religiosa.
É um bom contributo o que o prezado
Irmão está a fazer, no seu “site”, levantando assuntos que contribuam para
troca de ideias.
Cumprimentos amigos do
Estudos
bíblicos sem fronteiras teológicas