Pastor indiano de férias numa prisão (AF)

(Deverá “clicar” nas referências bíblicas, para ter acesso aos textos)

 

 

Sou indiano com formação superior realizada em Londres na área de electrónica e comunicação de navios. Sou ex-oficial da Marinha Mercante. Em 1979  tive um verdadeiro “encontro pessoal” com o Senhor Jesus.

A partir desse momento experimentei aquilo que as religiões afirmam ser uma conversão ou “novo nascimento”. Nessa ocasião meus olhos espirituais foram abertos capacitando-me a perceber os milhões de deuses que o meu povo adorava na sua ignorância e desconhecimento da verdade do real Criador.... São tantos os deuses na Índia... deuses com cara  de animais representados por cobras, elefantes e ratos entre outros.

Meu entendimento acerca desta idolatria foi ampliado e até pude ver que eu próprio também tinha o meu deus pessoal, afinal  eu adorava a tecnologia e também dava importância demasiada ao dinheiro.... que era a minha carreira profissional.

Mas agora após meu genuíno arrependimento, o Deus verdadeiro viera fazer morada em meu coração, tem transformado minha vida continuamente e pouco tempo depois da minha conversão dediquei de forma sincera e sem alienação emocional ou interesse próprio, a minha vida ao serviço no Reino de Deus na terra. Até aqui, mais de 25 anos depois, posso afirmar com gratidão EBENEZER... até aqui tem me ajudado o Senhor!

 

Trabalho em tempo integral na Índia. Em 90 % do meu tempo estou realizando alguma actividade visando fazer discípulos de Jesus. Apenas em 10% do meu tempo procuro me dedicar a “fazer tendas” para meu sustento pessoal e de minha família.

Desde o início da minha vida nova com Deus tenho desfrutado de muita comunhão com Jesus e com Seu auxílio tenho abraçado muitos desafios. Durante todo esse tempo  tenho experimentado o Seu amor, Seu cuidado e  poder manifestos em minha vida e través dela, cumprindo Seus propósitos e vontade, pois ainda inexperiente na fé com convicção em meu coração, fiz um pacto ou aliança com Jesus, consagrando minha vida para fazer parte efectiva de Sua Grande Comissão espalhando as Boas Novas de Cristo aos perdidos e não alcançados em qualquer parte da terra. Nessa consagração disse a Jesus: “Senhor, a qualquer hora..... em qualquer lugar.... aqui estou disposto a te seguir em obediência!”

 

E foi assim, que após um rápido treinamento e discipulado, participei em uma agência missionária cujo ministério era conhecido como “força Ágape”. Compreendi o chamado do Senhor me convocando e desafiando a ser  Sua testemunha até aos confins da terra. Actos 1:8. Minha primeira experiência transcultural nesse sentido foi no México e depois em países da América Latina... indo até Terra Del Fuego que fica no Sul da Argentina. Também estive no Sul do Brasil.

Mas um dia ouvi a Voz do Senhor me desafiando a voltar à Índia e falar do Seu amor para o meu próprio povo.

Assim em obediência voltei à Índia em 1989 e desde essa data  tenho desenvolvido alguns projectos evangelísticos, visando o treinamento de obreiros locais, na tentativa de melhor instrumenta-los para com maior eficiência desenvolverem o seu próprio chamado, compartilhando o Evangelho de Jesus Cristo, especialmente nas áreas onde nunca se ouvir falar Dele.... junto a povos não alcançados.

Em 1998 casei-me com uma brasileira também integrante da Grande Comissão de Jesus, pois a mesma viera para a Índia em 1995, em obediência à chamada de Deus em sua vida. Deus tem-nos abençoado com dois lindos filhos.... Raj de 6 anos  e Izaque com apenas um ano e 5 meses.

 

Hoje, 13 de Junho de 2006, estreia da selecção brasileira na copa  do mundo, faz um mês que a minha família e eu chegámos ao Brasil para um tempo de férias e descanso, após três anos consecutivos de trabalho na Índia. No entanto... nosso descanso não tem sido nada do que havíamos planejado, pois a violência no Brasil se agrava a cada novo dia espalhando terror e medo na população.

 Estamos hospedados na casa da minha cunhada no estado do Ceará. Sua casa parece mais uma Penitenciária de segurança máxima, pois trata-se de uma fortaleza com cerca eléctrica... portão electrónico, alarme instalado por toda a casa e câmaras para visualização. Na realidade sinto-me um preso em férias aqui no Brasil!!! Não posso sair livremente pelas ruas, nem tão pouco sentar-me  na calçada da casa no final da tarde para descontrair e relaxar as ideias porque o perigo de assaltos e sequestros é constante nessa região.

Noutro dia saí com meu filho mais novo para me sentar nessa calçada e logo fui advertido de que estava correndo risco. Meus momentos de descontracção, aqui no Brasil têm-se resumido no balançar nessas confortáveis redes, que desfrutamos aqui no Nordeste. Porém nem assim posso abusar porque tenho que preocupar-me com minha coluna.... Afinal, já não sou mais um jovem.

Voltando à falta de segurança, que tanto me assusta. Chegámos ao Brasil naquela semana de muita violência  em São Paulo, quando quadrilhas do crime organizado conseguiram parar uma das sete maiores cidades do mundo... espalhando pânico, terror e matando muita gente inocente.

Aqui em Fortaleza tem se espalhado uma onda de sequestros relâmpagos onde os bandidos sequestram  filhos de empresários ou famílias ricas para exigir grande somas de reais.

Noutro dia saí para uma caminhada..... Tive que retirar meu relógio do pulso e qualquer dinheiro que tivesse nos bolsos. Mas retornei em poucos minutos quando avistei alguns rapazes com comportamento suspeito me observando. E novamente retornei ao balanço rotineiro na minha rede na varanda, desta vez lendo o Salmo 23 e o Salmo 91. E nessas horas sou atormentado com questionamentos em minha alma.... do tipo.... “Onde está a sua fé e confiança em Deus, homem?!!”, “Os anjos do Senhor não se acampam ao redor dos justos para os guardar?!!”.

 

Duas semanas atrás meu cunhado, também evangélico e membro duma igreja onda a “fé manda e dá ordens a Deus.....” foi assaltado no portão de sua casa enquanto estacionava seu carro. O ladrão pôs a pistola na sua cabeça  ameaçando-o de morte caso ele demorasse a lhe entregar sua carteira e o telemóvel (celular).

Nessas horas, perguntas e mais perguntas perturbam minhas emoções e questionam a minha fé...

A Índia e o Brasil precisam de Jesus...... Lá temos milhões de deuses com caras estranhas e aqui.... outros deuses em forma de centenas de estranhas denominações.... Qual será então a seara mais carente do verdadeiro Evangelho e dos genuínos missionários? É a interrogação que não me larga.

 

É verdade que a Índia é um país idólatra... como  comentou comigo um “missionário” brasileiro que lá estava trabalhando há muitos anos.... Ele afirmava que nós, indianos, não éramos dignos do Evangelho e nem muito menos do sacrifício dele ao vir morar na Índia para nos evangelizar.... Ele ressaltava ainda, que no primeiro século também o Apostolo Tomé havia se desgastado nesse sentido. Nessa ocasião, é claro, que fiquei muito indignado com esse irmão, pois sua opinião apenas denuncia sua falta de amor e seu vazio de propósito eterno para sua estadia  na Índia.... que mais lhe serviu para enriquecer seu currículo fazendo Mestrado e Doutorado em nossas Universidades, enquanto os pobres irmãozinhos do Brasil lhe enviavam suas sacrificiais ofertas para seu sustento, imaginando que ele estava amando e se identificando com os  indianos para que esses viessem a assumir a forma de Cristo.

 

E ironicamente, aqui estou eu no seu país estarrecido com tanta maldade e violência.... e ainda assim amando essa gente e tentando a todo momento  reconciliar alguns deles com o seu Criador. E mesmo me sentindo preso  dentro desta fortaleza electrónica ..... crendo, que o Guarda de Israel está a velar por minha vida e família.... enquanto os marginais estão passeando livres e sem medo pelas calçadas e praças desse bonito pais, que é o Brasil, que tanto precisa de Jesus. Lembro-me desse incidente e sinto compaixão pelos brasileiros!

 

Outro dia me arrisquei um pouco e fui ao centro da cidade. Decidi me aventurar, assistindo ao culto em uma grande catedral de uma conhecida igreja evangélica aqui de Fortaleza. Mas muito me entristeci ao ouvir a pregação do pastor, que intencionalmente esquecera a verdadeira mensagem da cruz, se limitando a expulsar demónios, incluindo o da dor de cabeça.... quando não clamava por bênçãos financeiras para o seu rebanho.

 

Todos esses incidentes e pensamentos fervilham em minha mente fértil enquanto, mais uma vez  me balanço aqui na minha rede passando o tempo e já contando os dias para estar de volta à minha querida  Índia, com suas deliciosas massalas e invejável  tranquilidade..... apesar de seus milhões de miseráveis que não têm sequer onde reclinar a  cabeça.... mas que nem assim saem assaltando ou sequestrando inocentes em troca de alguns trocados....

Quando reflicto sobre isso dou graças a Deus pelo temor que eles têm da punição dos seus deuses e que os impedem de fazer algo semelhando a isto que vemos aqui no Brasil.

Que o Senhor continue tendo misericórdia de todos nós.....indianos e brasileiros!

António Francisco.

afcn888@yahoo.com

Fortaleza – Brasil – Junho de 2006  

 

 

 

 

 

COMENTÁRIOS

 

 

 

De: Valdecir Vieira Corrêa. affeir@hotmail.com

Li na íntegra a matéria “Pastor indiano de férias numa prisão” de autoria do pastor António Francisco, e quero aqui apenas tecer um pequeno comentário acerca desta dura realidade tratada na matéria, que é a terrível e crescente  onda de violência  que tem assolado a tranquilidade do povo Brasileiro.  Os fatos narrados pelo irmão indiano, ainda que não sejam novidades para nós brasileiros que vivemos nas grandes capitais, apenas revelam a certeza da impunidade na qual estes marginais se estribam, por causa inoperância do sistema judicíario brasileiro que atua em cima de um códico penal caduco, criado em 1940 e que na maioria dos casos não pune exemplarmente os criminosos, principalmente os de classe alta. Quem aqui no Brasil não está revoltado, com o caso do jornalista Antônio Marcos Pimenta neves, que assassinou de forma covarde e premeditada a ex-namorada Sandra Gomide, em agosto do ano de 2000, e agora mesmo depois de julgado e condenado a mais de 19 anos de prisão, consegue se manter em liberdade por causa de uma liminar que lhe havia sido concedida por um juiz do Tribunal Superior de Justiça? Nossa justiça é lenta e cheia de buracos que cabem centenas e centenas de recursos que prolongam de maneira absurda o julgamento de um processo por mais simples que ele seja.  Nosso sistema carcerário não recupera crimonosos, aliás, nossas prisões são verdadeiras escolas do crime organizado; um indivíduo às vezes rouba algo pra matar sua fome, se vai preso e fica um ou dois meses na cadeia, quando é solto, sai do presídio escolado, acaba se tornando um gênio do crime. Creio que o relato do nosso querido pastor indiano, é apenas a ponta de um iceberg que infelizmente, sem uma intervenção divina miraculosa , jamais se derreterá, pelo contrário, tenderá a ganhar força e tamanho, em  cada situação de impunidade que ocorrer por aqui, seja para qual for o tipo de crime cometido e por quem quer que seja. Que fazer diante da nossa impotência? Amados irmãos, só nos resta orar, para que Deus traga luz ao congresso nacional,  para que haja um trabalho sério, por pessoas sérias visando uma profunda mudança no nosso código penal, aí sim, com a reformulação das nossas leis, e o devido cumprimento delas, creio que o sol da justiça poderá começar a lançar seus primeiros raios nesta onda de violência que já se  tornou comum no nosso dia a dia. Enquanto isso não acontece, nos restam os ferrolhos nas portas, e a esperança de que o Senhor certamente  sempre há de nos guardar de todo mal.

Valdecir Vieira Corrêa.

Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil

2006/06/23

 

 

 

De: Helenton Costa Mendes - hcmendes@brturbo.com.br 

Data: 24/06/2006 23:45

Assunto: Missionário indiano no Brasil

Meu querido amigo Camilo

Obrigado pelo texto enviado. Tenho alguns comentários a fazer a título de esclarecimento. Concordo em com o que o prezado irmão escreveu mas torço para que muitos não leiam este texto. Quanto a pastores que dão ordens a Deus, expulsam demônios da dor de cabeça, da apendicite, etc etc e também pastores que pedem para que quem quiser ser curado, que ponha a mão sobre a parte doente do corpo (imagino uma irmã com problemas ginecológicos, como fará nessa hora...), realmente é essa a triste realidade na imensa maioria das novas “igrejas” que tem aparecido. O evangelho da cruz, da graça, esse, está esquecido. Infelizmente isto é verdade, não generalizando, é claro. Quanto à violência, aí sim, eu espero que poucas pessoas leiam este artigo. Sabe porque? A imagem do meu país já é corrompida no exterior que associa o Brasil somente com carnaval, floresta amazónica, violência,  mulher pelada e corrupção na política. Aí vem uma pessoa, que fala portugues, casado com uma brasileira o que dá mais veracidade ao que ele diz, e conta das mazelas que está sofrendo por aqui. Acho que os parentes dele deveriam se mudar urgentemente de bairro ou de cidade. Por falar em cidade, estivemos em Fortaleza em fevereiro passado em férias e gostamos demais de tudo o que vimos. Nos dias livres que tivemos, andamos pela cidade toda à pé, ônibus, carro, etc. Fomos à parte antiga de Fortaleza, visitamos museus, igrejas muito velhas. Anoitecemos na rua e, cansados, jantamos e voltamos para o hotel. Não tínhamos nenhum guia conosco. Em nenhum momento sequer vimos alguém ou alguma coisa que nos assustasse ou amedrontasse. Tenho a mais absoluta certeza de que há lugares perigosos e mal frequentados em Fortaleza, mas será que não há em Bombaim ou Nova Delhi? ou mesmo em Goa? Será que é seguro morar perto do Central Park em Nova Iorque e passear por ele sozinho mesmo à luz do dia? Será que é seguro caminhar à noite pelos bairros boêmios de Lisboa? Não estou, em hipótese alguma dizendo que o Brasil é um paraíso, muitíssimo pelo contrário, a violência aqui é alarmante e preocupante. Somente não concordo que esse senhor que não conhece o meu país fique com uma idéia tão distorcida, generalize o que viu e  publique na internet. Ele desconhece o Brasil ordeiro, que trabalha, que estuda, que vai em frente mesmo em meio à tantas mazelas. Ele escreve com se nem pudéssemos mais sair às ruas!!! Que absurdo!!! Acho sinceramente que ele deveria rever seus conceitos e voltar imediatamente para a Índia antes que tenha um ataque cardíaco por tanta preocupação. Já temos propagandas negativas demais no exterior.

Já chega disso.  Um grande abraço

Hélenton

Goio Erê – Paraná – Brasil – 2006-06-24

 

 

 

 

De: António Francisco. afcn888@yahoo.com

Caro Camilo,

Gostaria de enviar, conforme tua sugestão, mais algumas informações e comentários acerca das minhas experiências, em aditamento ao artigo que tenho na tua página.

Estive em São Paulo em 1988 e trabalhei lá depois do naufrágio. Vivi quatro meses visitando várias igrejas fazendo o “Chamado Macedónico” para que os brasileiros fossem lá a Goa onde o português ainda é falado por algumas pessoas da classe alta e antigos profissionais.

De lá veio uma turma de JOCUM (a Mara, minha esposa, fez a parte desta turma).

Moraram nesse meu edifício que te mostrei e a que chamamos de Casarão.

Em São Paulo morei em “Casa do meu Pai” com os meninos abandonados das ruas. Pensava aprender algo com essa experiência.

Nessa época não havia assaltos como hoje.

Em 1999 voltei ao Brasil, depois de casado, e morei em casa dos meus sogros. Não havia tantos assaltos.

Fizemos “palestras” numas 42 igrejas - e fizemos evangelismo.

Em 2003 estive pela terceira vez, e certo dia fui assaltado num cybercafé. Os bandidos entraram, amarraram-me com outros clientes e roubaram TUDO do dono. Pobrezitos que não puderam levar nada de mim, pois tinha somente um relógio de 5 reais que levaram e depois me devolveram. Nesse momento vi a graça do Senhor, e orei com os outros dentro duma dispensa, onde eles nos encerraram.

Mas hoje (2006) os assaltos aqui têm assumido proporções nunca antes vistas. Indirectamente o Brasil está sofrendo por motivos económicos... As dívidas dos outros países (EUA) etc.

Tenho tido bons tempos, fui a duas igrejinhas pequenas onde nos identificamos.

Recusei-me a ir às grandes igrejas, para não ser um objecto para entreter os “fieis”  com histórias “missionarias” – como já fiz no passado.

Oro para que o Senhor tenha misericórdia e a Sua graça abunde onde maior for o pecado.

António Francisco. afcn888@yahoo.com

Fortaleza em Julho de 2006

 

 

NOTA do responsável por esta página.

O Pastor António Francisco foi oficial da marinha mercante indiana e posteriormente trabalhou no navio Logos que naufragou na Tierra del Fuego, no Chile. É a esse naufrágio que ele se refere, no início deste comentário. Nessas horas bem difíceis em que estavam em risco as suas vidas, e havia dificuldade de comunicação entre os que só falavam inglês e os latino-americanos que só falavam espanhol, ele foi um importante elo de ligação entre todos os tripulantes e passageiros. Eles regressam à Índia nos próximos dias, onde têm uma pequena igreja que o Senhor me deu a oportunidade de conhecer, igreja verdadeiramente indiana, que não segue nenhuma denominação nem recebe qualquer apoio económico de igrejas do ocidente.

Penso que, quem volta ao Brasil depois de alguns anos de ausência, é natural que fique mais chocado com o aumento da insegurança a que os nossos irmãos brasileiros tiveram de se habituar.

Camilo 2006/07/12

 

 

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