Comentários ao artigo “Música religiosa”

(Deverá “clicar” nas referências bíblicas, para ter acesso aos textos)

 

 

Comentário do ir. David Oliveira (Goiânia) - Brasil

Prezado Camilo.

Estive a ler o teu artigo sobre a atual música religiosa nas igrejas, em resposta a Fábio Cruz.

É interessante observar que tudo é mutável na sociedade. A história da humanidade não é estática e tudo muda sempre, inclusive a música. O homem sofre influência daquilo que é diferente. Aristóteles dizia que: “nada atrai mais do que o que é diferente”. Esse “diferente” vem sempre de outros lugares que, na nossa ótica são mais exóticos, ou de pessoas que, embora sejam diferentes de nós, exercem, admiração por “não podermos” ser iguais a elas. Então, parece que tudo vai na direção ao que nós, os mais antigos rotulamos por exótico, profano, mundano ou extravagante.

Lentamente, vamos ocupando cada vez mais, posições de retaguarda, assim que novas gerações vão chegando. Muitos entendem isso como secularização; ou seja, trazer o mundo para dentro da igreja. Em certo sentido, não seria este, o desejo de Deus? Não seria Deus, exótico, para aqueles que precisam dEle? Não está escrito que Deus amou o mundo (humanidade) de tal maneira que deu o seu filho para que o “mundo” cresse nEle e que fosse salvo por Ele? João 3:16.

Na verdade, o mundo nunca esteve dentro da igreja, mas sempre dentro das cabeças das pessoas que estavam dentro das igrejas, inclusive de nossos dirigentes. O “não querer o mundo entrar nas igrejas”, está, muitas vezes no fato, de não aceitarmos a aproximação de pessoas iguais a nós (o igual não nos atrai); e por não amarmos o mundo como Deus amou, nunca entendemos, - ainda que equivocadamente - o exotismo ou a atração que exercemos sobre o mundo. E o mundo chegou a nós. Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora.  João 6.37. 

Agora estamos com esse dilema. “As novas gerações estão trazendo o mundo – em forma de música - para dentro da igreja”. Será que estes novos crentes são mais perversos que os mais antigos? Ou será que estávamos dentro de uma hipócrita redoma de santidade e sacralidade?

Não queremos que pessoas como o rei Manasses, ou Dimas, o colega de cruz de Jesus freqüente nossa igreja! Não queremos que Jesus almoce com Zaqueu, em sua casa ou que converse com a mulher Samaritana, ou que perdoe a adúltera. Somos santos demais para conviver com esse tipo de pessoas! E quanto a esses “rapazes doidos” que fazem suas guitarras gritarem um grito maior que suas gargantas podem suportar? O que estão a dizer para a igreja? Não adentraram à porta que é Jesus?  O problema é que não sabemos o que fazer com esse “laivo de novidade” e ficamos escandalizados. Todas as cousas são puras para os puros; todavia, para os impuros e descrentes, nada é puro. Porque, tanto a mente como a consciência deles, estão corrompidas. Tito 1:15. No popular: o homem diz ou pensa, o que o coração está cheio.   

Há muitos excessos nessas músicas – talvez não para eles -. Embora suas letras falem de Cristo, esses rapazes e moças dão mais valor ao espetáculo; shows de coreografias próprias do rock, e muito, muito barulho. Os barulhos da bateria e guitarras abafam totalmente o conteúdo da letra - Ninguém liga para a letra – e a platéia dança, pula e grita! Somente emoção; pura emoção, gritarias e vibrações! Não sei se é possível algum jovem sentir algum toque do Espírito Santo nessas horas. Também não sei se estão cometendo pecados, afinal, são apenas adolescentes; mas a igreja, tal como Cristo nos ensinou, é lugar de pecadores! Se Cristo veio para os perdidos Lucas 19:10, a igreja tem que ser lugar de “perdidos”; mas até há pouco tempo atrás, só sabíamos lidar com “santos”. Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em CRISTO JESUS. Romanos 8:1.

Esse problema dos cânticos e das músicas instrumentais nas igrejas tem-me admirado muito nos últimos dias. Há uns quatro anos, entrei numa loja de livros usados antigos e deparei-me com uma quantidade muito grande de hinários. Estavam lá a preço de bananas. Não se canta mais nas igrejas, usando hinários! O retro-projetor lança a letra da música na parede e temos de procura-la nos espaços, muitas vezes entre janelas, cortinas etc. Sou da época em que o dirigente perguntava à congregação, qual o número do hino a seguir, no hinário. O último número que ouvi, foi de uma irmã, que gritou: 360! Era o “Morri, morri na cruz”; isso já faz uns 25 anos.

Sou da época do harmônio (uma espécie de piano a pedais), do cravo, do pandeiro e do violão. Quando os instrumentos começavam a concorrer com a letra, logo o dirigente fazia o gesto com as mãos, para baixarem o som. Queríamos ouvir a mensagem da música.

Outro dia, recebi um telefonema de um antigo pastor, me convidando a assistir sua pregação naquela mesma igreja do hino número 360. Ele foi convidado depois de uns trinta anos que esteve a pastorear aquela igreja. Quando adentrei a nave, meus tímpanos quase estouraram quando recebi aquele barulho ensurdecedor! Era um conjunto de rock “gospel” e a guitarra dava aquele “show” de metal rangido. Aí pensei: quem te viu, quem te vê! Era uma igreja pentecostal, terrivelmente estóica! Depois fui saber: era o conjunto do filho do pastor! O coitado estava tão constrangido com o velho pastor, que quase não falava nada! Mas sua atitude falava mais alto que a guitarra de seu filho. Estava a dizer: tenho que engolir isso, para prendê-lo à igreja! Não dava para ouvir a voz de ninguém. Davam mais prioridade para os sons – ou ruídos - instrumentais. Mas é assim em todas as igrejas; não ouvimos as mensagens das letras, tal como nos antigos hinos dos irmãos antigos. Somente barulho! Barulho!

Antes, tinha entrado em outra igreja e o pastor pediu à platéia para que gritasse (grito mesmo), durante um minuto, sem parar. Foi o minuto mais longo de minha vida. O pior é que não podia sair; estava no meio de uma multidão de cinco mil pessoas! Já viu aquele assobio agudo alto misturado com gritos? Era uma espécie de desabafo do pastor contra o demônio. Se este não gosta de grito, nunca mais pisou lá!

A moda agora no Brasil é a dança. Muitas igrejas colocam jovens a dançar no palco. A última igreja em que estive, havia uma professora de dança, com salário e uma sala especialmente destinada aos ensaios. A coisa está mudando!

Abraços, David.  (Maio de 2005)

 

 

 

Comentário do ir. Afonso de Anciães Felício da Igreja Metodista do Porto – Portugal

Prezado irmão Camilo Coelho

Obrigado por partilhar este assunto, que é importante abordar. Achei-o muito interessante colocarem-lhe esta questão.

No meu ponto de vista, reflecte uma preocupação do seu interlocutor, não só de estética, mas também de uma atitude que o crente deve ter em relação ao Senhor da Igreja, durante o Culto, Vejo ainda que se procura uma aprovação social. Qualquer tipo de atitude que o crente em Cristo em Cristo deve ter, não só na vida, mas também quando de acção de Louvor durante um Culto, deve merecer-nos um especial cuidado. Diz-nos o Apóstolo Paulo em 1ª Coríntios 14:40, Mas, faça-se tudo decentemente e com ordem.. E nesta interpretação cabe a cada um de nós recolher com sensibilidade e com sabedoria, o sentido da ordem do Apóstolo.

Também somos cuidadosos connosco, na atitude dos gestos, da voz, no discurso, no discurso, na cultura, no vestir e até no alimento e no beber. Porque não nas músicas?

Nunca estive num debate sobre este assunto e nem nunca estive a procura de elementos históricos para saber o que pensar do tipo de música a utilizar nos cultos, porque esta questão nunca se me colocou.

O que sei é que a Bíblia menciona alguns instrumentos típicos da época e que constam nas referências que fez no seu bom estudo. 

Faço parte, há longos anos, de uma Igreja Reformada tradicional, que interpreta valores históricos, em que a música chamada clássica ou erudita é muito apreciada, como valor estético e não elitista.

Os nossos hinos são clássicos e conhecidos em todo o mundo das Igrejas Reformadas históricas. São de uma época em que o valor da mensagem e a contribuição musical se uniam à Adoração e o Louvor.

Alguns hinos têm músicas conhecidas e que foram populares no seu tempo, mas mereceram ficar nos hinários. A melodia e o texto, no entanto, reflectem valores típicos da época mas com valores e pensamentos actuais e que para nós são uma parte do nosso rico património.

Alguns dos nossos Concertos musicais são elaborados nesta base de música erudita para órgão, piano ou mesmo violino. Temos actualmente um bom órgão de tubos, que domingo aoos domingo, colabora nos Cultos e sentimo-nos enriquecidos por este facto. Há solenidade. É importante sentir esta atmosfera que convida à concentração e à apreciação estética da música.

Possuímos um caderno de cânticos em que muitos deles não tem música escrita e, por isso, são acompanhadas por guitarra clássica, a que chamam viola. São destinados a coros e apoiam, entre a Liturgia e algumas actuações e espaços. Os corinhos tem bonitas mensagens. Tem o seu lugar próprio.

Também apreciamos a voz humana, não só de forma individual, mas sobretudo em coros que são muito apreciados. A voz humana é muito bonita, Na Bíblia fala-se de coros de anjos. É música celestial na forma mais bonita: a voz e a palavra. A palavra “cantar” e “cântico”, recebem na Bíblia muitas referências, sinal de que a música é uma forma de adoração e louvor. Como esta referência não é um estudo, dispenso-me de mencionar as inúmeras passagens.

Claro que já tenho escutado crentes dizendo que não apreciam música moderna, barulhenta e às vezes ensurdecedora. Eu estou de acordo com este tipo de manifestação. Não é possível concentrar o espírito com tanto ruído. Sei que para a oração devemos procurar o silêncio para que possamos escutar Deus. E o Culto tem como centralidade a mensagem, a eucaristia e a oração. Jesus quando orava procurava o silêncio. E não havia, no seu tempo, tanto ruído, como hoje. Para Jesus era importante conversar a sós com o Seu Pai. O ruído não era apreciado.

Mas é claro que os tempos mudam. Temos hoje na Igreja e há já longos anos, um bom órgão electrónico que tem um bom som. Antes era um mecânico, também com bom som, mas muito cansativo de operar pelo organista. Há mudanças inevitavelmente, mas nem sempre significa melhor. O facto de nova música arrastar multidões, não significa que se descobriu melhor música. É apenas diferente. O homem procura sempre a felicidade ou a emotividade naquilo que não tem. Mas não devemos ficar fechados à modernidade e a novas formas de expressar.

Vivemos num mundo de relativismos

Numa visita que fiz a uma Igreja na Alemanha – Igreja Reformada do tipo conservador, verifiquei que o apoio musical era feito com piano. Não é uma Igreja feita de raiz, mas sim adaptada a uma sala de boas proporções. Além de piano tocam flauta e guitarra clássica. Tocam também em concertos e com outros instrumentos clássicos, como violoncelo e harpa. Para eles o mais importante é a Palavra e o amor entre os irmãos, além de apoiarem de forma prática, trabalho missionário e de educação teológica. Há bastantes leigos que apoiam o serviço da Igreja, com cursos completos de teologia.

Para concluir devo dizer que a música deve reflectir a cultura de um povo. Lembro-me de um incidente ocorrido com David, que vem relatado em 2º Samuel 6:3/23.

Temos ali um caso de uso de muitos instrumentos musicais e da própria dança de David que não teve receio em ficar um pouco menos bem vestido perante a alegria que teve em recuperar a Arca de Deus. Sua mulher não apreciou esta forma de manifestação alegre, mas sincera de David, o Rei de Israel, pela alegria de sentir a presença de Deus no meio do povo. Não foi abençoada. O importante é a consagração do povo a Deus.

Vivemos muito condicionados pela cultura de uma época.

Precisamos é de sabedoria e de dar um bom testemunho na Igreja e na sociedade onde vivemos.

Envio-lhe, com amizade fraterna, os meus cumprimentos.

A S Felício (Maio de 2005)

 

 

 

Comentário do ir. Nilson de GodoySão Paulo, Brasil

Bom dia

Li seu artigo, é realmente o que penso e gostaria que as Igrejas praticassem.

Creio que a música, na sua origem, é um dom divino, e como tantos outros dons que o homem recebeu ficou sujeito a ser deturpado por causa de não estar sob a “Crus de Cristo”.

O “bom e o mau” está impregnado na música que não é praticada sobre as bases Cristãs, seja ela música secular, religiosa, sacra, instrumental, folclórica…

Abraços fraternos

Nilson (Maio de 2005)

 

 

 

Comentário do ir. Orlando Caetano - Leiria, Portugal

Acerca de Jesus de Nazareth e da música cantada

Em primeiro lugar não encontro evidências de que Jesus tenha cantado. Mas, se ele costumav cantar, suponho que cantasse a música que no seu contexto cultural era cantada, pois vejo-o identificado com o seu povo.

Se assim for, creio que se Jesus viesse hoje a Portugal, cantaria as cantigas que se cantam neste país. Bem sabemos que a heterogeneidade das mesmas, assim como as suas origens e influências é notória. Presumo que Jesus cantaria aquelas músicas de que mais gostasse, e também de acordo com as circunstâncias e o ambiente em que se encontrasse.

Mas se estivesse noutro país (de Europa, de África, da América, da Ásia…) faria o mesmo, na igual pressuposição de que se iria identificar culturalmente com o povo da terra em que vivesse.

Falando da chamada “música cristã evangélica”, pouco tenho a dizer. Parece-me todavia, que ela é ainda mais influenciada pelas culturas americana e inglesa do que a música em geral. Basta reparar num hinário, por exemplo o “Cantor Cristão”, em que a grande maioria dos chamados “hinos” foram compostos por pessoas de língua inglesa e que inclui, entre eles, música nacionalista dos E. U. A. E da Inglaterra. Embora haja também, nesse hinário, algumas melodias originárias da Alemanha, da Itália, (especificamente da Sicília), e até uma ou outra de Israel, da Espanha, da França, do País de Gales e do povo maori. (*) Há ainda cânticos brasileiros (o “Cantor” veio do Brasil), estes sobretudo patrióticos. Mas falarde umn hinário é muitíssimo redutor. Não só porque há vários hinários, mas também porque existe outra música, paralela, mais ligada à sensibilidade juvenil, geralmente cantada com acompanhamento instrumental diversificado. Muitos desses cânticos têm sido trazidos de congressos e de outros eventos internacionais.

Há poucos compositores “evangélicos” portugueses e a sua música não é geralmente conhecida e utilizada. Haverá talvez, entre os chamados coros ou cânticos de louvor (soltos, reunidos em pequenas colectâneas, às vezes mostrados com rectroprojector…) melodias com sonoridade cultural portuguesa. Mas se houver são muito poucos, que eu saiba.

Também nem sequer sei se fará sentido, uma música especificamente cristã, no sentido de música de igreja, visto que me parece cada vez mais irrelevante a noção de Igreja como ela hoje é geralmente entendida. Mas isso ultrapassa o âmbito deste meu modesto comentário de opinião pessoal.

(*) Alguns desses hinos, apenas como exemplo: nºs 6, 14, 20, 47, 82, 94, 112, 165, 212, 217, 258, 267, 281, 290, 298, 323, 464, 467, 468, 477, 482, 483, 484, 527, 538, 557, 574, 578, 580.

Orlando Caetano (Maio de 2005)