Herança Amarga (AX)
(Deverá “clicar” nas referências bíblicas, para ter acesso aos textos)
Nosso Modelo Importado – Os Colonizadores
vêm em nome de Deus.
No Brasil, as igrejas de origem reformada (Luterana,
Presbiteriana, Menonita, Anglicana e etc.), bem como as de origem evangélica
(Metodistas, Batistas, Congregacionais e etc.) ainda, nos dias de hoje, estão
devendo o desenvolvimento de uma teologia e prática que reflitam um entendimento
do Novo Testamento aplicado às condições brasileiras. Ainda hoje funcionamos,
em grande parte, influenciados pela herança que recebemos dos missionários
estrangeiros, principalmente aqueles vindos da América do Norte. (1) (É da maior importância que o leitor esteja
informado que este trabalho pode lhe ser grandemente ofensivo se o mesmo for
americanófilo) (2). O resultado desta
influência tem se revelado no reducionismo que podemos ver nas igrejas em que o
cristianismo foi identificado com um padrão de vestimenta, mais adaptado aos
climas do hemisfério norte, e a um padrão de conduta reduzido a não fumar, não
beber e não freqüentar bailes ou cinema. De fato, alguns críticos (3), têm indicado que a única pergunta que
realmente importa neste tipo de Cristianismo é: ”Você já aceitou a Jesus como
seu Salvador pessoal?” Na segunda parte do século XX vimos uma aceleração no
processo de degeneração da verdadeira fé cristã, no Brasil, por dois motivos
principais.
O primeiro
foi a grande expansão da pregação do evangelho motivada e financiada pelo
Departamento de Estado dos Estados Unidos da América como uma forma de conter a
expansão comunista em toda a América Latina. (4)
O raciocínio por trás daqueles que eram
sustentados por tal iníqua aliança era a de que os fins (a pregação do
evangelho), justificavam os meios (o dinheiro vindo do contribuinte
estadunidense via Departamento de Estado). (5) De
fato, juntamente com a pregação do evangelho se advogava o capitalismo
estadunidense e seu expoente maior que é “o american way of life”, (ainda hoje
existem inúmeros missionários estadunidenses que acreditam piamente que o
padrão ou forma de vida deles é a melhor que existe!). A pregação posta em
prática, por tais homens e mulheres, em sua grande maioria, era eivada de
enorme hipocrisia, já que os missionários estrangeiros viviam de forma
nababesca (quando comparados à maioria do nosso povo), ao passo que pregavam o
evangelho às classes paupérrimas deste Brasil. A situação era tão ridícula que
guardo na lembrança dois comentários feitos por dois irmãos em momentos
distintos. O primeiro, comentando a contradição inerente acima mencionada,
disse que: “os missionários americanos ensinavam às lavadoras de roupas nas
beiras dos rios acerca dos benefícios físicos de se lavar as roupas com as
próprias mãos. E que, para serem melhor ouvidos, costumavam proferir tais
ensinos com um pé em cima de uma máquina de lavar e o outro em cima de uma
máquina de secar”. O segundo irmão não conseguiu evitar o impacto que sentiu ao
visitar a Estância Palavra da Vida e após ver a casa de vários missionários
falou em tom zombeteiro que “na próxima encarnação gostaria de voltar como
missionário estadunidense para o Brasil”. O controle da expansão do Evangelho
no Brasil, durante todo o século passado e ainda no início deste novo, esteve
firmemente seguro pelos estrangeiros, pois eles controlam o grosso do dinheiro
bem como as instituições educacionais e as editoras. Este controle é exercido
de maneira cabal. Qualquer voz discordante ou mesmo crítica será devidamente
silenciada. Centenas, milhares talvez, de jovens brasileiros dispostos a servir
o Senhor foram brutalmente massacrados (6) porque
ousaram desafiar os donos do poder. (7) Nossas práticas religiosas refletem claramente
os conceitos de colonizadores e colonizados. O resultado direto desta dominação
pode ser visto, de maneira exemplar, na história editorial das casas
publicadoras da segunda metade do século passado. Nesta história temos que
destacar que a grande maioria das editoras chamadas evangélicas, pelo menos as
mais relevantes, foram e muitas delas continuam sendo controladas por
estrangeiros, estadunidenses em sua grande maioria. (8)
Assim, em parte pela nossa própria fraqueza e em parte pela situação que
estamos descrevendo, nos foi imposta uma ditadura literária que tem dominado o
cenário e comandado a teologia que se praticou nos últimos 50 anos.
Começando
com o boom causado pelo livro de Ray Stedman (A Igreja Corpo Vivo de Cristo), e
passando por Hal Lindsey (A Agonia do Grande Planeta Terra) e todos os falsos
mestres que saíram do Seminário de Dallas, os quais inundaram o mercado com
seus livrinhos acerca das profecias bíblicas, que usaram e abusaram da
instabilidade no Oriente Médio para vender milhões de livros; por Larry Coy e
seu curso “Conflitos da Vida” que ensinava que a autoridade estava baseada em
uma estrutura hierárquica militarizada que foi muito bem apropriada pelos
estrangeiros, que sempre se consideraram os “oficiais”, enquanto nós não
passávamos de “soldados rasos” e onde não havia espaço para o ensino
genuinamente cristão da autoridade baseada na atitude de serviço; por James
Dobson e seus ensinamentos baseados exclusivamente no bom senso, sem nada de
novo, portanto; por Tim e Beverly LaHaye que espiritualizaram os conceitos inventados
por Hipócrates e perenizados por Galênio de Pérgamo acerca dos temperamentos e
tentaram nos ajudar a fazer sexo melhor (Temperamentos Transformados pelo
Espírito e O Ato Conjugal); por Juan Ortiz, que foi o primeiro idealizador dos
cultos diários e dos grupos de células, ainda que ele não tivesse usado tal
terminologia; por Peter Wagner e suas teorias acerca do crescimento da igreja
baseado no que ele mesmo chamava de um “novo fundamento”; por James Kennedy e
seu (ai) Evangelismo Explosivo; por Robert Schüller e o Pensamento da
Possibilidade que ressuscitou as idéias já mortas de Norman Vincent Peale; por
John Wimber que associado a Peter Wagner nos brindou com o Evangelismo de
Poder, reeditado recentemente por Jack Deere (Surpreendido pelo Poder do Espírito);
por Rebecca Brown, Rick Joyner, o romancista Frank Peretti e novamente Peter
Wagner que nos ensinaram tudo que sabemos acerca de batalha espiritual,
endemonhinhamento de cristãos, quebra de maldições e demônios territoriais; por
Kenneth Hagin Sênior e Júnior e Kenneth e Gloria Copeland que foram no século
XIX e ressuscitaram o neo-gnosticismo de E. W. Kenyon. Não dá sequer para dizer
que eles plagiaram já que tudo não passa de cópia dos escritos de Kenyon mesmo (9); por Bill Hybels e Rick Waren que tentam
reciclar as teorias de Peter Wagner acerca do crescimento da Igreja mediante o
que está sendo chamado de “evangelismo efetivo”, com ênfase na igreja para a
classe média e um verdadeiro flerte com a modernidade onde se procura fazer a
“igreja crescer” através da utilização de práticas gerenciais, do marketing,
das ciências do comportamento humano e das comunicações; e finalmente, por
César Castellanos e suas teorias acerca de sonhar e ganhar o mundo. É curioso
notarmos que este período começa com um autor (Ray Stedman) que chamava o
bendito Espírito Santo de “o poder da ressurreição” e termina com outro (César
Castellanos) que O chama de “o especialista”. E eu me atrevo a perguntar: o que
há de errado com a expressão “CONSOLADOR”?
Agora,
em tempos mais recentes, tomamos conhecimento de um livro escrito por Peter Jones
(10) (um inglês radicado nos Estados Unidos
e que tem uma agenda política bem definida) que chama de “esquerda espiritual”
tudo que está associado à Nova Era, doutrinas que vão do neo-gnosticimo, ao xamanismo, ao espiritismo e
etc. Ou seja, tudo que não presta é de “esquerda”! Estariam de volta as
relações inconfessáveis? Ou nosso autor é apenas um inocente imbecil nesta
argumentação? Entre suas pérolas gostaria de destacar a seguinte: Peter Jones
chama de “namorico” o relacionamento promíscuo que existia entre a primeira
dama Nancy Reagan (ela pertence à direita política) e os astrólogos que
pululavam dentro da Casa Branca quando seu marido era o presidente dos Estados
Unidos; por outro lado ele chama de “bruxaria” as sessões espíritas promovidas
por Hillary Clinton (ela é considerada como pertencente à esquerda política)
quando seu marido era o presidente. Não senhor Jones, as duas mulheres,
certamente praticaram coisas detestáveis ao Deus verdadeiro e seus maridos, os
ex-presidentes Ronald Reagan e William (Bill) Clinton, seriam, nas palavras do
professor do Massachusetts Institute of Technology, Noam Chomsky, enforcados,
se fossem julgados por crimes praticados contra a humanidade pelos mesmos
critérios usados no tribunal de Nuremberg, que julgou os nazistas após o
término da Segunda Guerra Mundial! (11) Mas isto não é tudo. Peter Jones acredita
piamente que a Cristandade e a Civilização Ocidental são dignas de serem
preservadas já que, na opinião dele, a Civilização Ocidental está edificada
sobre a estrutura da civilização bíblica e do teísmo cristão. Será mesmo?
Além
de tudo o que mencionamos até aqui, a última onda importada diretamente das
terras do Tio Sam são os livros da assim chamada “auto-ajuda”. Estes livros
procuram imitar e repetir o sucesso que tais obras fazem na cultura mundial. Ou
seja, estamos tentando imitar o mundo porque o que o mundo faz é bem sucedido,
vende e dá lucro. No meio de tudo isto, não podemos nos esquecer da influência
deletéria de falsos messias como Jimmy Swagart que foi flagrado duas vezes com
prostitutas, uma vez no estado de Louisiana e outra no estado da Califórnia,
enquanto pretendia ser o maior evangelista do mundo; ou simplesmente canalhas
mesmo, como Pat Robertson do Clube700, que levantou um império de comunicações
com dinheiro de ofertas de irmãos do mundo inteiro, inclusive do Brasil, para
depois vendê-lo para a Rede FOX e embolsar US$ 250 Milhões como se lhe
pertencessem. Mais recentemente Pat Robertson sugeriu que os Estados Unidos
assassinassem o presidente Hugo Chavez da Venezuela. Estranho, muito estranho
alguém que se diz pastor sugerir o assassinato de uma pessoa. Mas estes são os
tempos em que vivemos. Tempos de uma cristandade capitaneada por estadunidenses
e completamente anormal e falida.
Temos
ainda que destacar que nos poucos, últimos anos, uma plêiade de editoras surgiram
no horizonte das publicações evangélicas no Brasil. Como são todas empresas
privadas não temos muitas informações acerca das mesmas. Acompanhando uma
conferência aqui ou uma convenção ali ficamos sabendo que quase todas elas são
controladas por estadunidenses ou por brasileiros que já foram, no passado, empregados
daqueles. Pela qualidade das publicações fica bem evidente a intenção meramente
comercial do que é publicado, chegando ao cúmulo de duas editoras publicarem um
mesmo livro (livros em domínio público) com títulos levemente diferentes.
O segundo
motivo foi o surgimento de vários movimentos, libertos da influência administrativa
dos estrangeiros, mas ainda dependentes daqueles teologicamente, que imaginaram
criar movimentos autóctones. Estes novos senhores feudais nacionais, se
apropriaram do que de pior existia nas práticas dos estrangeiros e submetem nosso
povo a uma tirania tão brutal como a que nos foi imposta por aqueles. Entre
estes podemos citar, por um lado, os defensores de velhas heresias, já
devidamente condenadas na história da igreja, como as Igrejas “Universal do
Reino de Deus, Sara Nossa Terra e Internacional da Graça de Deus” que seguem de
maneira apaixonada os ensinos heréticos do neo-gnosticismo de E. W. Kenyon. Por
outro lado, nós encontramos invencionices modernas como a chamada “batalha
espiritual”, para não mencionarmos as elucubrações revelatórias de movimentos
como o G-12 que trazem ensinos nunca antes ouvidos como o da “cobertura
espiritual”, por exemplo. Uma terceira onda é representada por Bill Hybels e
Rick Warren, que advogam uma versão mais leve da pregação do evangelho, e
acreditam que existem pessoas que estão “buscando” Deus, apesar da ênfase
bíblica de que “não há quem entenda, não há quem
busque a Deus” - Romanos 3:11
Por
estes motivos, continuamos raquíticos e despersonalizados. De fato, como todo o
resto da Cristandade, nós estamos perfeitamente encaixados na descrição feita pelo
filósofo e profeta dinamarquês Søren Kierkegaard quando disse: ”O Cristianismo
da Cristandade tira do Cristianismo a ofensa, o paradoxo, etc., e no lugar
deles introduz a probabilidade, aquilo que pode ser compreendido de maneira
plena. Isto é, transforma o Cristianismo em algo inteiramente diferente daquilo
que ele é no Novo Testamento, sim em algo que é exatamente o oposto. Este é o Cristianismo
da Cristandade, de nós os homens” (12). E
nós temos vivido este tipo de Cristianismo por muito tempo. Seja porque somos
administrados por estrangeiros com intenções inconfessáveis, seja porque nos
submetemos a verdadeiras heresias ou modismos, não somos capazes de desenvolver
uma teologia bíblica e uma teologia educacional que seja ao mesmo tempo
Neo-Testamentária e voltada à satisfação das nossas necessidades. E os motivos
desta nossa incapacidade são discutidos a seguir.
I – Escolas Teológicas
(Instituições Educacionais)
Nossas
escolas teológicas começaram como Institutos Bíblicos o que em outras palavras significava
a admissão implícita de que ofereciam, uma educação “meia boca”. Estas escolas
estavam, quase sempre, repletas de professores que eram pastores bem
intencionados, porém mal preparados. Naqueles dias a formação de pastores seguia
modelos importados e não se preocupava com as reais necessidades do povo brasileiro.
Os currículos eram cópias traduzidas da educação que os estrangeiros haviam
recebido. Naqueles tempos o patrulhamento ideológico era tão intenso que
qualquer menção às ciências sociais, para se discutir, por exemplo, as questões
da miséria e da fome, eram vistas como subversivas, comunistas e desagradáveis
a Deus mesmo. Muitos daqueles senhores que nos ensinavam firmemente a orarmos
pelas “autoridades constituídas”, mesmo pelos brutais ditadores e torturadores
brasileiros, mostraram-se reticentes quanto a incentivarem as orações pelo
presidente eleito pelo povo Luis Inácio Lula da Silva. O resultado direto deste
tipo de educação é que nossos pastores não aprenderam a pensar nas necessidades
do nosso povo (13) e
conseqüentemente não podiam pensar em formas de satisfazê-las.
Não
foi até a década de 80 que começaram a surgir, em quantidade, pastores e professores
brasileiros com formação de mestres e doutores vindos do exterior. Todavia,
fomos novamente contaminados, pois nossos mestres e doutores estavam, como seus
mentores estrangeiros, mais preocupados em manter o status de estudiosos,
gastando mais tempo estudando do que ensinando ou pregando. Encastelados em um
conhecimento distante e alienados das reais necessidades do povo, acreditaram
que haviam “chegado lá”, quando na verdade estavam a anos-luz da realidade
vivida pelo povo brasileiro. Tais mestres costumam se levar muito a sério (14). Da
mesma maneira que os estrangeiros usam o saber como um instrumento de dominação,
nossos mestres e doutores não nos estenderam a cortesia de sermos todos servos
de Jesus. Pelo contrário, mantiveram de todas as maneiras a separação imposta
pelos estrangeiros entre “nós e eles”. As conseqüências não se fizeram esperar.
Nossos mestres se negaram a nos transmitir os meios de produção acadêmica e se
concentraram em expor suas idéias e exibir seus “vastos conhecimentos” sobre
todos os assuntos. O resultado foi a produção massiva de pastores que não
entendem as ciências bíblicas, principalmente as ciências da interpretação. Por
este motivo, tais pastores produzem sermões que não fazem o menor sentido e não
conseguem integrar a verdade bíblica à realidade brasileira. Por não entenderem
o significado do texto bíblico para os leitores/ouvintes originais, os mesmos
têm enormes dificuldades em aplicar e integrar as verdades bíblicas com as
necessidades dos tempos presentes. Como diria um conhecido, nossos pastores são
peritos em sermões de três pontos: 1) Ele entra no texto; 2) Ele sai do texto e
3) Ele nunca mais retorna para o texto.
O ensino
foi também caracterizado por uma enorme ênfase em teologia sem a existência das
pontes necessárias entre o que era ensinado e a importância que estes mesmos
ensinamentos tinham para os dias de hoje e a vida comum do povo de Deus. Uma
vez formados, a grande maioria dos pastores descobria que, o dia a dia da vida
da igreja local, demandava conhecimentos e práticas que não haviam, em muitos
casos, sequer sido mencionados nas escolas teológicas. Matérias fundamentais
relacionadas à educação cristã foram relegadas ao último plano e rotuladas de
“matérias só para mulheres”. Com isto nossos pastores, já tão machistas, pela
formação natural do homem brasileiro, desprezaram as únicas matérias que
poderiam levá-los a questionar as necessidades do povo e buscar supri-las
através dos ministérios da igreja. Hoje em dia, a situação é terrível já que o
ensino formal é considerado desnecessário por muitas denominações
(neo-pentecostais principalmente), outras têm uma obsessão compulsiva pela
teologia do culto (pentecostais) e outras continuam mantendo o distanciamento
entre a teologia e a prática (evangélicos e protestantes). Com tudo isso, o
despreparo ainda é quase absoluto e faz parte da herança amarga que nos foi imposta.
II – Igrejas (Corporativas
e Institucionais)
Em
segundo lugar, nossa incapacidade tem a ver com a institucionalização e o
corporativismo das nossas igrejas denominacionais. Como nossas “matrizes”
estrangeiras nós estamos muito próximos do abismo que confunde respeitabilidade
com espiritualidade. Chegamos a um ponto em que já não somos mais cidadãos de
segunda classe quando comparados à igreja Católica Romana. O próprio “mercado”
já nos reconhece como um alvo a ser atingido. Mas certamente estamos muito
longe de sermos ou de continuarmos a ser dignos descendentes e representantes
da verdadeira igreja. Ricardo Gouvêa resumiu de forma brilhante o quadro atual
ao dizer: “o protestantismo tornou-se hoje uma tradição religiosa pesada,
clericalizada, institucionalizada, sistematizada, e o ensino da palavra de Deus
acaba muitas vezes perdido sob o entulho dos anos de reflexão escolástica, do
ensino pragmático, do sensorialismo tolo, da pseudo-ortodoxia
desespiritualizada e da prática ritualista. Hoje o protestantismo tornou-se tão
tradicionalista quanto a igreja católica, e às vezes ouço alguém comentar que é
quase como se fosse necessária uma nova reforma protestante.” (15) Sim, é necessário uma nova reforma.
O leitor
não precisa ir muito longe para constatar o que está escrito aqui. Uma leitura,
mesmo superficial, da Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil, por
exemplo, mostrará de maneira clara o corporativismo que dá aos “presbíteros”
todos os direitos e ao povo somente duas obrigações: calar a boca e pagar as
contas. A atitude demonstrada por Jesus ao lavar os pés dos discípulos não tem
nenhum valor na cristandade do século XXI. Em vez de seguir o exemplo de Jesus.
João 13:13/15,
nossos líderes religiosos, se parecem mais com o personagem Sacripante, pessoa
de índole violenta, mau caráter e falsamente piedosa, do poema Orlando
Innamorato, de Matteo-Maria Boiardo (1434-1494), e do poema Orlando Furioso, de
Luigi Ariosto (1474-1533). A Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil no
Parágrafo Único de seu Art.30 diz que as Sagradas Escrituras chamam os
ministros de: “Bispo, Pastor, Ministro, Presbítero ou Ancião, Anjo da Igreja,
Embaixador, Evangelista, Pregador, Doutor (Doutor?) e Despenseiro dos Mistérios
de Deus”. Leia a lista novamente e me diga que palavra chave está faltando, a
única palavra que realmente importa segundo Jesus. É isto mesmo meu caro
leitor, a palavra que falta na lista é: SERVO. Olhe ao seu redor, não importa a
que denominação você pertence e responda: os líderes da sua denominação estão
servindo os irmãos (fazendo os serviços mais insignificantes como lavar os pés)
ou estão se servindo dos irmãos? (16) Estão nossos líderes seguindo o ensino de
Jesus quando ele disse: “Sabeis que os que são
considerados governadores dos povos têm-nos sob seu domínio, e sobre eles os
seus maiorais exercem autoridade. Mas entre vós não é assim; pelo contrário,
quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem
quiser ser o primeiro entre vós será servo de todos” – Marcos 10:42/44 Não
creio que estejamos vendo esta qualidade de serviço. Nossas lideranças se
parecem muito mais com aqueles que buscavam os primeiros lugares nos banquetes
e nas sinagogas. Note como se congratulam e como sempre convidam seus pares
para estarem junto nas plataformas. Como fazem questão dos títulos de “pastor”,
“reverendo”, “ancião” etc. Como se vêem distintos dos irmãos. Estes pequenos,
mas emblemáticos sinais demonstram de maneira clara que não estão seguindo o
exemplo de Jesus. A falta da genuína fraternidade é a prova mais contundente do
fracasso absoluto da cristandade.
III – Educação Cristã
Padronizada (Programas X Pessoas)
Nada
ressalta de maneira mais absoluta nossa incapacidade do que nossa abordagem da educação
cristã e dos ministérios da igreja. Na maioria das nossas igrejas um planejamento
dos ministérios educacionais da igreja é completamente inexistente. Não se
pensa nada de novo. Ao se iniciar um trabalho, se importam os formatos já
conhecidos (quase tudo que está disponível nos dias de hoje é diretamente
importado das terras do tio Sam) e utilizados nas igrejas de origem. Os modelos
importados, (17)
não entendem que as necessidades dos ribeirinhos da Amazônia são muito
diferentes das necessidades dos gaúchos que vivem na fronteira com o Uruguai.
De acordo com Eugene Peterson “a espiritualidade e o ministério são sempre locais
e específicos, e acontecem sob condições específicas para cada caso”. (18)
Ademais,
não existe a formação de pessoas nas igrejas locais para administrarem e ministrarem
às mais diversas necessidades. Isto se deve, diretamente, à incapacidade dos
nossos pastores, já que é competência dos mesmos o aperfeiçoamento
dos santos visando o desempenho do seu serviço para a edificação do corpo de
Cristo - Efésios
4:12 Mas isto não lhes foi ensinado no seminário, e muito menos lhes foram
fornecidas as ferramentas para se atingir tais objetivos. Nossos pastores
refletem a imagem dos seus mestres. São vaidosos e se consideram distintos dos
irmãos que compõe o rebanho, não apenas no aspecto funcional (reconhecido pelas
escrituras, pois temos funções diferentes dentro do corpo de Cristo, a igreja),
mas também posicional (desconhecido das escrituras já que todos nós,
independente da função, estamos posicionados “em Cristo”). Tudo isto nos leva a
uma educação cristã padronizada onde os programas são mais importantes que as
pessoas, já que são, na maior parte das vezes, impostos de cima para baixo. A
vaidade humana tem total supremacia sobre as necessidades das pessoas. Tudo
começa com a incapacidade que temos de determinar quais são as necessidades das
pessoas às quais pretendemos ministrar. Não conhecendo as necessidades nada
podemos fazer para satisfazê-las. Não admira que estejamos perdendo desde
crianças até adultos da terceira idade. Nossos programas padronizados não levam
em conta que cada grupo (crianças, adolescentes, jovens, adultos solteiros,
adultos casados sem filhos, adultos casados com filhos, pessoas de meia e da
terceira idade e isto para não falar nas mães solteiras, viúvas, órfãos,
pessoas separadas ou divorciadas e etc.) tem suas próprias características e
necessidades e anseiam por ter suas necessidades individuais satisfeitas. Sem
conhecer as necessidades não conseguimos estabelecer os alvos certos. Ou seja,
estamos atirando a esmo, sem chances reais de acertar os alvos corretos. Sem os
alvos apropriados, não importa os programas e pouco importam os métodos e
materiais utilizados e são totalmente irrelevantes os métodos de organização e
administração, que possamos ter. Os mesmos não atingirão o alvo certo e jamais
satisfarão as necessidades reais das pessoas. A apatia enfrentada pelas
denominações tradicionais tem um diagnóstico preciso: não estamos satisfazendo
as necessidades das pessoas. No outro lado da moeda isto também explica o
porquê do grande sucesso das novas igrejas, como as que mencionamos acima. Em
um país miserável e de miseráveis, em um país de desempregados, em um país onde
a insegurança é palpável, em um país onde o sistema de medicina do estado e o
sistema previdenciário encontram-se em completa falência faz muito sentido
oferecer soluções mágicas para a falta de dinheiro ou bens, a falta de emprego,
de saúde e de segurança. As técnicas de embromação (fraude, burla) se
multiplicam tão ou mais velozmente do que a multiplicação do desespero das
pessoas. Desta maneira, estas formas de religiões pseudocristãs, apesar de
condenarem de maneira veemente as religiões afro-brasileiras, o espiritismo e a
idolatria patrocinada pela igreja Romana, acabam por oferecer soluções mágicas
e imediatas iguais àquelas das formas religiosas que condenam. A confusão é
imensa. Mas será que está tudo perdido? Não, se pensasse assim não estaria aqui
escrevendo estas linhas e desejando compartilhar uma forma de retornarmos ao
ponto onde as pessoas voltem a ser nossa prioridade número um. Somente quando
entendermos qual é o propósito distinto e singular de Deus para nossos dias, e
que este propósito de Deus tem tudo a ver com pessoas, poderemos então iniciar
uma caminhada no sentido de reconstruir a igreja, ou como já foi mencionado
anteriormente efetuarmos uma nova reforma.
IV – Consumismo e
o Culto de Celebridades (Celebritismo)
O último,
porém não menos importante que os três anteriores, é o consumismo e o culto de
celebridades que se instalou em nossas igrejas como fruto da nossa perene
dependência cultural, principalmente à forma do cristianismo como praticado nos
Estados Unidos da América. Uma rápida folheada em nossas revistas evangélicas
mais representativas (Defesa da Fé, Eclésia, Enfoque Gospel e Ultimato) nos
mostra o uso abusivo de celebridades evangélicas (pastores, professores,
missionários, líderes denominacionais, autores, músicos e etc) sendo usados
para vender de tudo que se possa imaginar: livros, cadeiras e bancos;
seminários e conferências inclusive no exterior; cartões de crédito, cds, Dvds,
fitas (cassetes) de áudio e fitas de vídeo, softwares para computadores e
jogos; cursos de teologia para qualquer nível de educação que os candidatos
tenham; bíblias, livrarias, revistas, materiais educacionais para escola dominical
e materiais para discipulado; candidatos a cargos eletivos, lojas e shoppings
evangélicos, feiras e exposições; serviços de duplicação de fitas, Cds e Dvds e
material escolar; hotéis, acampamentos e estâncias para realização de
conferências, encontros e etc; aparelhos de som e instrumentos; viagens para
Israel, Disney e até lua de mel no Havaí; sítios da Internet e hospedagem de
sítios, portais e provedores de Internet; agendas, papéis de carta e
marcadores; tanques batismais e um curso de teologia Judaico Messiânico (seja
lá o que isto quer dizer); mensagens de pastores que são celebridades em forma
de vídeo, fitas e cds e entrevistas; editoras, brinquedos e cirurgia plástica;
filmes de média e longa metragem, desenhos animados, animadores e apresentadores
de programas; perfumarias, cosméticos e medicamentos; camisetas e bonés,
adesivos (auto-colantes) e stickers; louças manuscritas, quadros e fotos;
emissoras de rádio e televisão, clinicas pastorais, jornais e festivais de
musica; diversas organizações são vendidas sob o título “MINISTÉRIO”; preletores,
dramatizações em áudio, treinamento missionário e faculdades; serviços
bancários, vitrais e mosaicos decorativos; planos de saúde e serviços médicos;
projetores e retro projetores, serviços gráficos, móveis, devocionais diários e
cruzeiros marítimos. Ah, e não se esqueça: “aceitamos dinheiro, cheque, VISA,
Mastercard, American Express e Diners”! Pode acreditar nada do que foi listado
acima é fruto de invenção. Está tudo anunciado nas revistas chamadas evangélicas.
Entre o que se vende gostaria de
destacar três itens porque os mesmos possuem características especiais e servem
como fetiches ou elementos de mistificação. Eles são:
A - Viagens para Israel – Começando com
Caio Fábio na década de 80 e ainda bastante forte neste dias, salvo por uma ou
outra “intifada” que mata milhares de pessoas, a maioria esmagadora de
palestinos, apesar de a mídia insistir em mostrar Israel como sendo a vítima,
este é um dos produtos mais vendáveis e mais rentáveis. Funciona mais ou menos
assim: primeiro você descobre alguém que tenha um público, alguma celebridade e
a convida para ministrar um curso em Israel. Depois você inventa um título
pomposo (“Amigos de Sião” ou “Caravana Teológica” servem perfeitamente). Depois
é só negociar com uma agência de viagens e pronto. Todas as propagandas que
promovem tais viagens deixam transparecer inúmeras mentiras tais como: “Deus
vai ficar muito contente com você se você for visitar a terra santa” ou “Você
atingirá um nível de espiritualidade incomparável ao visitar a terra santa” ou
ainda “A Bíblia terá outro sabor se você visitar a terra santa” ou “Você será
completamente mudado se você for batizado no rio Jordão, igualzinho a Jesus”.
Tais mentiras inferem claramente, que aqueles que não dispõe dos recursos para
fazer tais viagens não agradam a Deus, que são inferiores espiritualmente, que
não conseguem aproveitar a Bíblia como deveriam e que receberam um batismo de
terceira comparado com o batismo no rio Jordão. Não, ir a Israel não faz de
ninguém um cristão melhor. Pelo contrário, a ida a Israel, no esquema citado
acima, normalmente transforma os viajantes em pessoas esnobes e arrogantes que
passam a tratar os outros com desprezo. Se você não viajou e conhece alguém que
viajou sabe muito bem do que estou falando.
B - Seminários, Convenções
e Encontros – Esta é a versão mais barata do turismo evangélico. Existem
hoje no Brasil tantos seminários e conferências e encontros oferecidos que a
impressão que se tem é que toda semana tem um evento destes acontecendo em
algum lugar do país. As propagandas são sempre muito parecidas. Além de
promoverem o evento, dão destaque para os preletores (alguns são verdadeiros
arroz de festa), para as acomodações, e fazem apelos singelos a favor do louvor
e da comunhão. Muitos não escondem suas verdadeiras intenções e oferecem preços
especiais para pastores que liderarem grupos para o evento. Um destes
seminários comandados por um pastor estadunidense (a colonização continua
firme), oferecia um regalo especial para o que eles chamavam de “pastor nota
10”. Na minha ingenuidade achei que pastor nota 10 fosse aquele homem que
realmente servia a Deus e ao próximo seguindo o exemplo de Jesus Cristo. Eu
estava enganado. O pastor nota 10 a que a propaganda se referia era o pastor
que conseguisse inscrever pelo menos 10 pessoas para ouvirem o pastor
estadunidense falar. E qual era o presente? Um workshop (a palavra oficina não
servia?) com o próprio pastor estadunidense. Lembre-se, para participar deste
encontro oferecido para um seleto grupo com a celebridade era necessário
inscrever 10 pessoas no seminário. A pobreza do que se é apresentado em muitos
destes seminários é tão absurda que ao retornar de um destes encontros as
pessoas só falam das acomodações, do lazer, da alimentação e claro, do turismo
local que tiveram oportunidade de fazer. Não lembram muita coisa do que foi
falado, mas o louvor foi muito bom! Rever os amigos também foi ótimo. Existem
verdadeiras confrarias de irmãos que se encontram todos os anos nos mesmos
seminários. Freqüentam os seminários para encontrar os amigos e para por as
notícias em dia! Como não poderia ser diferente, nestes encontros se vende de
tudo que foi alistado acima.
C – Bíblias – Este é um fenômeno
novo. Até bem pouco tempo a única diferença que existia entre as Bíblias
disponíveis no Brasil, para os chamados crentes, era o tamanho físico e a
versão de Almeida, corrigida (ARC) ou atualizada (ARA). De repente, aconteceu uma
verdadeira inundação de bíblias de todos os tipos e para todos os gostos. Este
processo é chamado de segmentação e nas palavras de Russel Shedd “esta segmentação
veio para ficar”. Lembrando tudo que falamos até agora não será difícil
imaginar de onde nós importamos a grande maioria das Bíblias que agora ilustram
de maneira tão clara até onde vai a ganância humana. Se você está pensando que
nós importamos estas Bíblias dos Estados Unidos da América, você está
absolutamente certo! A dominação que comentamos no início se mantém e agora da
maneira mais perversa que é a representada por esta mercantilização descarada
da palavra de Deus. Esta questão é da maior importância, pois é neste campo que
uma enorme manipulação está acontecendo. Responda depressa: Você acha que é
possível menos de 20 tupiniquins (19) e estrangeiros,
produzirem uma tradução completa da Bíblia (Antigo e Novo Testamentos),
partindo do zero e utilizando somente os manuscritos originais, em 10 anos,
sabendo que uma mesma tradução para a língua inglesa ocupou mais de 100
tradutores e demorou 25 anos para ser terminada? Desculpe-me, mas eu não acho
possível. Todavia isto é o que os editores da Nova Versão Internacional (NVI)
querem nos fazer acreditar. Aliás, diga-se de passagem, quem publica a NVI é
uma organização estadunidense chamada de International Bible Society. Os problemas
com esta tradução em português são vários.
Em
primeiro lugar ela não é uma tradução completa do Antigo e do Novo Testamento baseada
exclusivamente nos originais hebraico, aramaico e grego, por mais que os
editores insistam em dizer que é. O diagrama de tempo apontado acima não permite
tal proeza no prazo e com os recursos disponíveis. Ela é, quando muito, uma
tradução do inglês com eventuais referências aos manuscritos originais. Uma leitura,
mesmo superficial do capítulo 1 do livro de Gênesis em inglês e português da
NVI, não deixa dúvidas acerca da afirmação anterior. A equivalência (palavra/idéia
em um idioma que corresponde a uma outra palavra/idéia em outro idioma) e
especialmente a seqüência das palavras, como encontradas em português e
inglês são inaceitáveis para uma tradução alegadamente independente e feita
diretamente dos manuscritos originais. Basta ler qualquer outra tradução seja a
Almeida Revista e Atualizada ou mesmo a Bíblia de Jerusalém e compará-las com a
NVI para ficar bem evidente o que estamos falando.
Em
segundo lugar esta tradução está sendo alardeada como a bíblia do século XXI e a
propaganda deixa claro que outras traduções estão velhas e ultrapassadas.
Em
terceiro lugar, é óbvio que, excluídos os interesses financeiros (porque os negócios
envolvendo a produção e venda de bíblias são multimilionários), não existe
nenhuma necessidade da produção de uma nova tradução da bíblia em português já
que a tricentenária tradução de João Ferreira de Almeida, iniciando com a
chamada Tradução Brasileira de 1902 e
através de suas revisões (revista, corrigida, atualizada, contemporânea,
segunda edição e etc) tem servido muito bem ao povo brasileiro. Além do mais, a
própria Sociedade Bíblica do Brasil já tem produzido uma nova tradução visando
atualizar a linguagem que é a Bíblia na Linguagem de Hoje (BLH) (20) É
inaceitável a promoção de uma tradução à custa de outras. As políticas mercadológicas
de produção e venda de bíblias, especialmente destas novas que estão surgindo,
são tão descaradas que deveriam nos fazer corar de vergonha. A imposição da
NVI, com as práticas mercadológicas condenáveis que a promovem, é mais um
elemento na longa lista do que temos que engolir como resultado do abuso do
poder econômico que estadunidenses, em nome do Senhor, tem utilizado para nos
explorar. Não bastasse este embuste chamado NVI, temos sido brindados com
algumas jóias da invencionice estadunidense tais como “A Bíblia de Estudo em
Cores”, “A Bíblia Devocional da Mulher” (que existe também na sua versão para
homens), e uma multidão de bíblias “anotadas” começando com a de C. I.
Scofield, passando pela de C. Ryrie e terminando com a indefectível Bíblia Shedd.
Quem poderia querer mais? A grande verdade é que apesar desta multiplicidade de
bíblias, a palavra de Deus continua sendo ignorada e pessoas usam tais bíblias
como fetiches para indicarem algum tipo de superioridade por estarem apenas
portando tais volumes. É lógico que os editores não estão preocupados se o povo
está lendo tais bíblias. A preocupação deles está concentrada no volume das
vendas. Visitando uma livraria evangélica nos Estados Unidos, é possível contar
mais de 100 “segmentações” da bíblia. Então já dá para saber a quantidade de
“segmentação” que estará vindo por aí e nos será imposta pelos nossos
dominadores.
Depois
da versão bíblica chamada “A Rocha”, que foi a primeira bíblia de estudos utilizando
o texto da NVI, agora temos a Life Application Study Bible, que usa a versão do
texto de Almeida Revista e Corrigida e que está sendo promovida com os seguinte
dizeres: “Agora em Português, a Bíblia de Estudo número 1 em vendas. Mais de 40
milhões (imagine o lucro!) de Bíblias impressas no mundo”. A própria NVI tem
uma versão com notas lançada no Brasil e como não poderia deixar de ser é
alardeada com as seguintes palavras: “A Bíblia NVI é reconhecidamente a maior e
mais completa do gênero em todo o mundo”. Ou seja, cada uma é melhor e maior que
a outra. Isto além de constituir uma aberração é uma deslavada mentira já que as
duas não podem ser a “melhor” nem a “maior”!
Um outro aspecto que temos que destacar também
é o surgimento de bíblias voltadas de forma específica para uma ou outra denominação
como a “Bíblia de Estudos Pentecostal” que foi produzida para atender, de forma
específica, aos conceitos teológicos das Assembléias de Deus. Os presbiterianos
também já podem ser vistos portando garbosas “Bíblias de Genebra”, que é uma
versão, sob encomenda, contendo a interpretação calvinista das escrituras. Será
que não se percebe que a chamada segmentação zomba e menospreza da Bíblia como
a palavra inspirada do soberano Deus? Precisamos de uma Bíblia só. Podemos até
discordar em como interpretá-la em um ou outro ponto (cada um dará conta de si
mesmo a Deus), mas daí a criarmos e nos submetermos a esta miríade de versões é
inaceitável. E promovermos uma versão em detrimento de outras, além de deixar
bem claro a intenção mercantilista, é imoral para dizer o mínimo. (21) É importante destacar aqui, como não poderia
deixar de ser, que a grande maioria dos missionários estadunidenses trabalhando
atualmente no Brasil, endossam e fomentam de forma entusiástica a NVI, e isto
não é mera coincidência. Eles preferem uma tradução mais próxima da versão
inglesa da NVI contra as versões de Almeida produzidas pela Sociedade Bíblica
do Brasil.
Mas
seriam estes problemas típicos somente da igreja brasileira? Conhecendo a história
da igreja chamada cristã espalhada ao redor do mundo, temos profunda convicção
de que estes problemas não são exclusivos da igreja brasileira. De fato a
igreja chamada cristã no Brasil está inserida no contexto mundial e faz parte
de um problema que transcende nossas fronteiras. A igreja chamada cristã no
Brasil faz parte de uma civilização chamada cristã que é em muitos, senão em todos
os aspectos, a negação completa daquilo que é o ensino claro das Escrituras
Sagradas.
É intenção
do autor compartilhar com os leitores, nos próximos artigos, a visão gloriosa
de Deus acerca do significado bíblico do que representa sermos chamados para
ser ekklhsia tou Qeou
- ekklisia tou Theou – povo chamado por Deus. Apesar das nossas práticas
contemporâneas e, o que é mais importante, nossa maneira atual de pensar
representarem inúmeros e formidáveis obstáculos a atingirmos o alvo agora
proposto, ainda assim seguiremos em frente dependendo do nosso sábio e poderoso
Deus.
São
Paulo – Maio de 2006
Convidamos a ler os comentários
a este artigo
(1) Samuel Viera reconhece
“ser o Protestantismo Brasileiro um protestantismo de missão e ter recebido
muita influência de igrejas estrangeiras, principalmente americanas” em O Império Gnóstico Contra-ataca, São
Paulo, Editora Cultura Cristã, 1999.
(2) Segundo o Dicionário Aurélio “Americanófilo” é aquele que é
partidário da América, em especial dos Estados Unidos da América, em
detrimento de outros países. Normalmente tal partidarismo é irracional e
não está baseado em fatos. É puro chauvinismo.
(3) Molly Ivins e Lou Dubose levantam
esta acusação em SHRUB – The Short
but Happy Political Life of George W. Bush, New York, VINTAGE Books, 2000.
(4) Loraine Boettner no seu livro Catolicismo Romano, São Paulo, Imprensa Batista Regular, 1985,
admite que países católicos como o Brasil “têm recebido assistência material
substancial de nações protestantes, particularmente dos Estados Unidos da
América, de modo que sua atual condição econômica, social, política e
religiosa, não é nem de perto tão ruim como seria se estivessem abandonados à
sua própria sorte.” Se a arrogância não fosse tão grande, a cegueira acerca da
nossa situação seria completa! Emílio de
Laveleye em Do Futuro dos Povos Católicos,
São Paulo, Casa Editora Presbiteriana, 1950, também acredita que os
protestantes são sempre mais instruídos e mais ricos quando comparados aos
católicos.
(5) Detalhes extensos de como o dinheiro dos contribuintes estadunidenses
via Departamento de Estado, financiou missões evangélicas, e em alguns casos,
patrocinou o genocídio de povos nativos, no Brasil e em toda América Latina
podem ser vistos em obras como as de
Gerard Colby e Charlote Dennett Thy Will
Be Done – The Conquest of the Amazon: Nelson Rockfeller and Evangelism
in the Age of Oil, HarperCollinsPublishers, 1995. Este livro está
também disponível em português.
(6) Talvez esta expressão seja um pouco pesada, mas a verdade é bem
pior. Uma vítima me disse o seguinte: “Alex, eu preferia muito mais que eles
tivessem me amarrado pelos pés e me arrastado pelas ruas do que terem feito
comigo o que fizeram na assembléia da igreja. Quanta mentira, quanta violência,
quanta falta de amor.”
(7) Rubem Alves em Protestantismo
e Repressão, São Paulo, Editora Ática, 1982, diz o seguinte: os detentores
do poder resistem “a qualquer tentativa de inovação, resistência esta que se
legitima através da sacralização das formas de pensamento e comportamento
herdadas do passado, e que se torna efetiva pelo estabelecimento de mecanismos
institucionais de controle que se encarregam de eliminar as formas desviantes
do pensamento e comportamento”.
(8) De fato, não somente editoras, mas todo tipo de “ministério”, dentro
do universo chamado evangélico, ou seja, dentro da forma de cristianismo que
não seja Católico Romano, tem passado de pai para filho no melhor estilo de “negócio
familiar”.
(9) A neta de E. W. Kenyon move processo por cópia dos escritos de
seu avô, contra os Hagin e os Copeland. Como é possível que homens que se dizem
ungidos pelo poder de Deus copiem deslavadamente os escritos de uma outra pessoa
sem lhe dar o devido crédito? Para quem quiser se aprofundar nesta questão o
livro de D. R. McConnell A Different Gospel
– A Historical and Biblical Analysis of Modern Faith Movement, Peabody,
Hendrickson Publishers Inc, 1988, apresenta extensas passagens em colunas
paralelas dos escritos de Kenyon e Hagin/Copeland expondo a cópia deslavada,
disfarçada sob o pretexto de revelação direta do Senhor!
(10) Peter Jones, A Ameaça Pagã, São Paulo, Editora Cultura
Cristã, 2002.
(11) John Mather e Judy Groves, Introducing
Chomsky, Icon Books, Cambridge, 1999.
(12) Kierkegaard,
Soren, The Moment
and Late Writings: Kierkegaard’s Writings Vol. 23, Princeton, Princeton
University Press, 2000.
(13) De acordo com o Iniq (Índice de Iniqüidade Social) do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, publicado em 2003 e citado por Clóvis Rossi
em seu editorial na folha de São Paulo de 8 de Setembro de 2003, cerca de 94,5%
da população Brasileira vive abaixo dos padrões mínimos de qualidade de vida
que incluem: habitar em moradias resistentes (alvenaria ou madeira), ter água e
esgoto tratados, possuir eletrodomésticos básicos (fogão, geladeira e rádio) e
uma renda per capta familiar de US$ 50 por mês.
(14) Aqui cabem bem as palavras do poeta cearense Belchior quando diz:
“Nesta terra de Doutores, Magníficos Reitores, leva-se a sério a comédia...”.
(15) Ricardo Quadros Gouvêa na introdução do livro de Emil Brunner O Equívoco sobre a Igreja, São Paulo, Editora
Novo Século Ltda., 2000.
(16) No Balanço oficial de uma Igreja histórica um item chamou minha
atenção em um dos gráficos. O item tinha o título “Ação Social” e ao lado um
valor percentual que lia: 6%. Apesar de
achar que aquela denominação devesse investir bem mais do que meros 6% em “ação
social” ainda assim fui verificar os detalhes de onde aquele dinheiro estava
sendo aplicado. Que instituições estavam recebendo os recursos? Para minha
surpresa descobri que os recursos alocados sob o título “Ação Social” são destinados
a pagamentos de benefícios de previdência privada para pastores da denominação
(provavelmente não todos). Ou seja, um pequeno grupo se serve em vez de servir
de maneira sacrificial, da força corporativa da Igreja como um todo. Que
vergonha!
(17) Talvez os casos mais clamorosos sejam os representados por Rick
Warren e seu livro “Uma Igreja com Propósitos” (recomendado pelo Pastor Ary
Velloso como sendo “o melhor, mais prático e o mais rico ensino sobre o crescimento
da igreja depois do livro de Atos dos Apóstolos”) e por Cezar Castellanos e seu
livro “Sonha e Ganharás o Mundo” (recomendado pela pastora e missionária
Valnice Milhomens). Estes dois livros representam modelos de evangelização que
disputam os corações dos pastores brasileiros. Um é originário da Califórnia
nos Estados Unidos e o outro nos chega diretamente de Bogotá na Colômbia. Para
que o leitor tenha uma visão bastante clara da manipulação perversa que estes
dois senhores implementam em seus livros, peço que leia o artigo “Enganados de Propósito: A Diferença entre Alimentar Ovelhas e Entreter
Cabritos”.
(18) Peterson, Eugene, O
Pastor Desnecessário, Rio de Janeiro, Editora Textus, 2001.
(19) “tupiniquins” Aos leitores que não estejam no Brasil, devo
dizer que se trata dum brasileirismo que usamos para nos referir a nós mesmos,
i. e. aos brasileiros, já que os índios tupiniquins eram uma das etnias nativas
do Brasil.
(20) Existem ainda outras traduções contemporâneas como a promovida
por um ministério que se autodenomina “educacional cristão” e responde pelo
nome de Alfalit, bem como a tradução denominada TEB que quer dizer Tradução Ecumênica
da Bíblia.
(21) Gostaria de ilustrar o mercantilismo corrente com o seguinte. A
revista Vidamix, que é parte da nova mentalidade mercadológica que procura
dissimular a propaganda em outras formas, editada pela Editora Vida para
promover seus produtos, traz na capa da sua edição de número 7 do ano 4 a
seguinte chamada: “Doce como mel – Texto fiel e claro da Bíblia NVI conquista
leitores de Norte a Sul do país, abrindo espaços inusitados para a
evangelização”. A Editora Vida é parceira da International Bible Society na
publicação e distribuição da Nova Versão Internacional da Bíblia no Brasil. No
corpo da “matéria”, dentro da revista, a título de reportagem (mas que não
passa de propaganda pura e simples) nós temos inúmeras citações de apoio ao
produto: 1. “Com a NVI, a intenção é desconstruir impressões equivocadas sobre
a Bíblia, mostrando que esta é a palavra de Deus hoje” (Robson Ramos,
Diretor Executivo da Sociedade Bíblica Internacional). Aqui se infere que outras traduções causam impressões equivocadas e que
não podem ser a palavra de Deus para hoje; 2. “O texto bíblico na Nova
Versão Internacional foi escolhido oficialmente pela Associação Evangelística
Billy Graham para a evangelização no Brasil” (Idem). A associação Evangelística Billy Graham teve inúmeras de suas campanhas
financiadas pelos Rockfellers e fez parte do grande esquema de relações
inconfessáveis citado no início desta introdução. E o próprio Billy Graham
endossou (pelo seu silêncio e conivência) o genocídio de povos latino
americanos e do sudeste asiático na década de 60,(ver obra citada: Thy Will Be
Done – The Conquest of the Amazon: Nelson Rockfeller and Evangelism in the Age
of Oil), bem como o genocídio, de mais
de um milhão (1.000.000) de Iraquianos, a maioria crianças abaixo de 10 anos de
idade (ver documentário produzido pelo jornalista australiano John Pilger para
a BBC de Londres intitulado “Killing the Children of Iraq” – Matando as
Crianças do Iraque).; 3. “Com a linguagem da NVI é mais fácil de
entender a bíblia” (suposto presidiário encarcerado no complexo desativado
do Carandiru na cidade de São Paulo). Teria
este presidiário tido a oportunidade de ler outra tradução e podido
compará-las?.; 4. “O texto da NVI é mais adequado tanto para
evangelizar quanto para o uso nas igrejas, entre os crentes” (José Bernardo,
Diretor da Associação de Missionários Mantenedores da Evangelização); É claro, as outras traduções são menos
adequadas. 5. “A NVI é muito mais fácil de ser entendida pela
garotada do que as versões mais tradicionais da bíblia” (Secretária de Educação
da cidade de Custódia no interior do Pernambuco). A inferência é óbvia.; 6. Temos que reconhecer que existem “muitas
tribos indígenas no Brasil que nunca terão as Escrituras completas em sua
língua. A melhor tradução da palavra que eles poderão ter acesso será a NVI,
que é a melhor do mundo” (Jaime Carlos dos Santos, estadunidense radicado
no Brasil a serviço da Missão Cristã Evangélica). Se é tão boa assim vamos levar a tradução em português para o mundo
inteiro; 7. “A NVI é um ponto de referência para tirar dúvidas entre
todas as versões que possuo. Ela garante uma interpretação melhor, pois sua
tradução é mais clara e direta” (Alexandre Fonseca da Igreja Batista de
Lauzane Paulista). As implicações são
óbvias, as outras traduções não são claras e diretas e não servem como ponto de
referência; 8. “Leio a NVI do
púlpito e vejo que as pessoas compreendem melhor a mensagem” (Alexandre
Ferreira Casimiro, vice-presidente da Igreja Batista Bíblica Nacional). .A NVI é melhor compreendida, o pastor vê
isto do púlpito, não se trata de estudo científico; 9. “Tenho várias
Bíblias, mas a que mais me toca é a NVI” (Erwiton Edgar Briljants de São
Paulo). Está é uma opinião pessoal e
totalmente irrelevante. Diante de tanta propaganda, perguntamos como o
editor da revista não se envergonha de apresentar a matéria como reportagem?
Não tem nada de reportagem. Uma “reportagem” que endossa 100% um determinado
produto é como um conto da carochinha. No começo da pretensa reportagem ainda é
contada a estória de uma tal de “Edna” visando indicar a superioridade de NVI.
Na estória de Edna, se colocam as seguintes palavras na boca de um marginal
“devidamente maquinado”: “Minha mulher também é estudante de direito. Ganhou
duas Bíblias na Nova Versão Internacional. E a minha?” Seria realmente cômico
se não fosse trágica a pretensão embusteira. Até poderíamos aceitar que o
ladrão pedisse uma Bíblia para a Edna. Mas daí a dizer “eu quero uma Bíblia,
mas tem que ser na versão NVI” já é demais. Temos que ter muita santa paciência
para lidar com estes manipuladores inescrupulosos!
Estudos bíblicos sem fronteiras teológicas